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Todos ganham com o voluntariado empresarial

Por Cilene Marcondes/ Cidadania-e   20 de setembro de 2002
Foto de Divulgação
São Paulo - Unir as estratégias gerenciais e de marketing de seus negócios em prol da comunidade através de programas de voluntariado empresarial. O que parece um paradoxo é, na verdade, uma prática cada vez mais comum, onde o que vale é a vontade das pessoas de dedicar parte de seu tempo para algum projeto social ou comunitário.

Regulamentado no Brasil em 1998, pela Lei nº 9.608, o trabalho voluntário é definido como uma atividade não remunerada, prestada por uma pessoa física a uma entidade pública de qualquer natureza ou a uma entidade privada sem fins lucrativos, com objetivos cívicos, culturais, científicos ou de assistência social, sem vínculo empregatício e obrigações trabalhistas, previdenciárias ou afins. Já o voluntariado empresarial é um conjunto de ações realizadas por empresas para incentivar e apoiar o envolvimento dos seus funcionários em atividades voluntárias.

Para uma empresa, um programa de voluntariado traz vantagens em todas as áreas. Segundo a coordenadora de Voluntariado Empresarial do Centro de Voluntariado de São Paulo, Juliani Gandini, alguns desses benefícios são o maior envolvimento dos funcionários com a empresa, maior interação entre os funcionários, melhora da imagem institucional e o aumento da motivação e produção do público-interno. Os funcionários que fazem trabalho voluntário são, de acordo com executivos, motivados, produtivos e leais à empresa. Ou seja, além de gerar melhoras sociais, o voluntariado empresarial também passou a ser visto como uma ação estratégica das empresas.

“O nível de conscientização da sociedade civil aumentou”, afirma Juliani. A coordenadora também explica que, em média, as empresas têm entre 8% e 10% de seus funcionários atuando como voluntários em programas desenvolvidos pela companhia ou por entidades sem fins lucrativos.

O que fazem as empresas?

De acordo com a responsável pela área de Parcerias e Regionalização do Instituto Ethos, Cristina Murachco, são vários os motivos que levam uma empresa a investir em um programa de voluntariado empresarial. Uma das principais razões é a própria demanda do público interno dessas empresas, que demonstra interesse em participar de atividades junto à comunidade. Outro motivo é a direção da empresa, que passou a perceber o voluntariado como uma forma de interagir com os funcionários e promover a integração desses com a comunidade onde estão inseridos.

“Não há uma padronização nesses programas. Temos exemplos interessantes de empresas que contribuem para entidades onde seus funcionários atuam e os liberam algumas horas por mês; e outras que desenvolvem programas bem estruturados, com planos e metas. Há ainda aquelas que oferecem apenas espaço físico para que os funcionários que voluntariam se reúnam”, conta Cristina.

Cristina afirma que o número de empresas que desenvolvem programas de voluntariado tem aumentado muito nos últimos anos e credita esse movimento, em parte, aos exemplos bem sucedidos de outras empresas que obtiveram grande visibilidade com seus projetos sociais. Além disso, ela também aponta o maior debate e cobertura da mídia sobre ações de responsabilidade social empresarial e o Ano Internacional do Voluntariado, comemorado em 2001 pela Organização das Nações Unidas (ONU) como fatores de promoção do voluntariado.

“Quando falamos de grandes empresas, como as multinacionais, o que vemos é uma adaptação dos programas de voluntariado que elas desenvolvem em outros países para a realidade do Brasil”, explica Cristina. “São causas e públicos diferentes. Por exemplo, na Europa e nos Estados Unidos é comum ter ações voltadas para o meio ambiente. Já aqui, apesar de haver programas nesta área, a grande maioria das ações é voltada para a comunidade”, completa.

Um estudo feito em 1998 pelo CEATS/USP – Centro de Estudos em Administração do Terceiro Setor da Universidade de São Paulo -, em parceria com CIEE – Centro de Integração Empresa-Escola, GIFE – Grupo de Institutos, Fundações e Empresas e Senac/SP, mostra que a maioria dos programas de voluntariado empresarial enfoca a criança e o adolescente, principalmente os problemas de qualidade de ensino e de capacitação profissional.

Intitulada ‘Voluntariado Empresarial – Estratégias de Empresas no Brasil”, esta pesquisa foi realizada em âmbito nacional, ouviu 273 empresas de grande, médio e pequeno porte e revelou, entre outros dados, que 48% das companhias em operação no País apóiam a atuação de seus funcionários como voluntários em projetos sociais, sendo que, 17% delas afirmam ainda que seus funcionários desenvolvem ações como voluntários, inclusive durante os horários de serviço.

Para o especialista da área de Relações Empresa-Comunidade da United Nations Volunteers (U.N.V.), órgão das Nações Unidas para o voluntariado, Roberto Felício, o voluntariado corporativo ainda é muito tímido no Brasil, se considerado o potencial do País. “Podemos e devemos nos capacitar para a prática do voluntariado”, diz Felício. “Com a globalização, as relações comerciais se tornaram mais complexas, o que torna necessária uma releitura por parte das empresas, no que diz respeito às suas ações no meio em que atuam, e principalmente junto aos seus públicos, que estão cada vez mais atentos e conscientes”, afirma Felício. “Os empresários cada vez mais estão percebendo que o mundo não é composto de estranhos, mas sim, de uma relação direta com seus vizinhos, parceiros, clientes, empregados e acionistas”, acredita.

Exemplo de sucesso do Banco do Brasil

Criado há 10 anos, o BB Educar é um exemplo de ação voluntária que superou os limites da empresa que o criou, o Banco do Brasil. Inicialmente elaborado por um grupo de funcionários do banco para alfabetizar os colaboradores terceirizados, como faxineiros, copeiros, carpinteiros, etc, o programa obteve excelentes resultados e foi implantado na comunidade.

“No começo, os próprios funcionários do Banco do Brasil atuavam como alfabetizadores e, depois que a Fundação Banco do Brasil assumiu o programa, em 2000, o BB Educar se caracterizou pela atuação em parcerias”, conta a coordenadora da área de Educação e Desportos da Fundação, Maria Dulce Rezende do Vale.

Atualmente, o sistema de parcerias – a maioria delas com o setor público – permite que 69 mil pessoas freqüentem as aulas de alfabetização do programa que já atendeu mais de 87 mil pessoas na última década. Segundo Maria Dulce, o Banco do Brasil conta com mais de 1,5 mil funcionários alfabetizadores voluntários neste programa e 51 funcionários que desenvolvem atividades de instrutores e são responsáveis pelo treinamento de todos os alfabetizadores, sejam eles do banco ou contratados pelos parceiros.

Francisco Pedro Primo, de 48 anos, é um desses funcionários que desenvolvem ações de voluntariado no BB Educar. Há 25 anos trabalhando no Banco do Brasil, Primo conta que soube do programa em 1994, através do informativo interno do banco. “Assim que conheci o BB Educar decidi implantar aqui no Piauí, onde moro, classes de alfabetização”, lembra. De alfabetizador ele passou a coordenador do programa naquele Estado e, desde o final de 2001, é um dos instrutores do BB Educar.

“O trabalho hoje é diferente, cresceu e melhorou muito. Com as parcerias, podemos atingir um número cada vez maior de pessoas”, diz Primo, se referindo a parceria feita com o Governo do Piauí, que entre 2000 e 2001 alfabetizou 8,4 mil pessoas e tem 7,7 mil em salas de aula atualmente.

Para Primo, a atuação voluntária é uma grande satisfação – pessoal e profissional. “Pessoal porque faço uma coisa que gosto e acredito, além de ajudar a mudar a realidade da região onde vivo, e profissional porque me sinto reconhecido dentro da empresa”.

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