Notícias
ONU deve ser digna da confiança que o mundo tem nela
Por Folha de São Paulo   14 de março de 2003
Em poucos momentos essa responsabilidade foi sentida pelos membros do CS
como tão pesada quanto nesta semana
Kofi Annan
A carta das Nações Unidas é categórica. "Afim de garantir a ação rápida e eficaz da organização", ela confere ao Conselho de Segurança "a responsabilidade principal pela manutenção da paz e da segurança internacionais". Em poucos momentos essa responsabilidade foi sentida pelos membros do CS como tão pesada quanto nesta semana. De fato, em breve eles terão de fazer uma escolha decisiva.
A questão em jogo nessa escolha possui uma importância que não se limita ao Iraque: trata-se da ameaça que as armas de destruição em massa fazem pesar sobre a humanidade inteira. A comunidade internacional precisa agir em conjunto para frear a proliferação dessas armas temíveis, onde quer que ela aconteça.
De imediato, o mais urgente é fazer com que o Iraque não possua mais tais armas. Por quê? Porque já as utilizou no passado e porque por duas vezes, sob a égide do presidente atual, cometeu uma agressão contra seus vizinhos -contra o Irã, em 1980, e contra o Kuait, em 1990.
É por essas razões que o Conselho de Segurança decidiu eliminar essas armas no Iraque e, a partir de 1991, adotou resoluções sucessivas exigindo o desarmamento desse país.
Os povos do mundo inteiro desejam que esta crise seja resolvida por meios pacíficos. Eles estão extremamente preocupados com o imenso sofrimento humano que sempre acompanha a guerra, quer ela seja de duração longa ou curta. Além disso, temem as consequências de longo prazo que esta guerra, em especial, pode vir a ter.
Eles temem que a guerra gere crises econômicas e instabilidade na região e que, como é frequentemente o caso com as guerras, tenha consequências imprevistas que dêem lugar a novos perigos.
Será que ela tornará ainda mais difícil a luta contra o terrorismo ou a busca pela paz entre israelenses e palestinos? Será que semeará a discórdia profunda entre as nações e as populações de crenças diferentes? Pode ela comprometer nossa capacidade de trabalhar em conjunto para fazer frente a outros problemas comuns no futuro?
São dúvidas graves, e as respostas a elas precisam ser pensadas com cuidado.
Às vezes pode ser necessário recorrer à força para enfrentar ameaças à paz, e a carta da ONU prevê essa eventualidade. Entretanto a guerra deve sempre ser o último recurso. Não se deve recorrer a ela enquanto não tiverem sido tentadas todas as outras soluções razoáveis -no caso atual, unicamente se tivermos a certeza de que já tenham sido esgotados todos os meios pacíficos para assegurar o desarmamento do Iraque.
A Organização das Nações Unidas, fundada para "preservar as gerações futuras do flagelo da guerra", tem o dever de buscar uma solução pacífica até o último instante.
Terá esse momento chegado? É essa decisão que os membros do Conselho de Segurança terão de tomar agora.
A decisão é séria. Se eles não conseguirem chegar a um acordo em torno de uma posição comum e se alguns deles lançarem uma ação sem o aval do Conselho, a legitimidade dessa ação será amplamente questionada e ela não conseguirá o apoio político necessário para garantir seu êxito a longo prazo, uma vez concluída a fase militar.
Se, por outro lado, os membros do Conselho, apesar do pouco tempo que resta, conseguirem chegar a um entendimento quanto a uma linha de ação comum, para assegurar a aplicação de suas resoluções anteriores, então a autoridade do Conselho será reforçada, e o mundo ficará mais seguro.
Não devemos esquecer que a crise no Iraque não existe no vazio. Os acontecimentos nesse país terão repercussões profundas sobre outras questões de grande importância.
Quanto maior for o consenso em torno da abordagem a ser adotada, maiores serão nossas chances de podermos novamente nos unir e fazer frente, de maneira eficaz, a outros conflitos explosivos, a começar por aquele que opõe israelenses e palestinos. Todos nós sabemos que uma solução justa desse conflito pode trazer uma esperança real de estabilidade durável para a região.
Fora dos limites do Oriente Médio, o sucesso ou fracasso da comunidade internacional no que diz respeito ao Iraque vai incidir de maneira crucial sobre sua capacidade de intervenção nos acontecimentos não menos inquietantes na península coreana.
O trabalho realizado para solucionar conflitos que provocam tanto sofrimento na África será igualmente afetado, na medida em que as perspectivas de estabilidade e desenvolvimento às quais o continente aspira com tanta urgência correm o risco de ser comprometidas.
A guerra não é o único flagelo que o mundo precisa enfrentar. Quer eles busquem proteger-se contra o terrorismo ou estejam em luta contra as três chagas que são a pobreza, a ignorância e a doença, os países precisam trabalhar em conjunto e podem fazê-lo por intermédio da ONU.
Seja qual for a maneira pela qual a diferença atual se resolva, a ONU continuará a exercer um papel central, como exerce hoje. Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para que ela conserve sua unidade.
Nos últimos meses, pudemos constatar, em todas as partes do mundo, o imenso valor que não apenas os Estados, mas também os povos atribuem à legitimidade que conferem a ONU e o Conselho de Segurança, pelo fato de constituírem o quadro comum de consolidação da paz.
Agora que falta pouco para a grave decisão que eles deverão tomar nesta semana, espero que os países integrantes do Conselho de Segurança da ONU tenham em mente essa confiança sagrada que os povos do mundo inteiro depositaram neles e que se mostrem dignos dela.
Kofi Annan
A carta das Nações Unidas é categórica. "Afim de garantir a ação rápida e eficaz da organização", ela confere ao Conselho de Segurança "a responsabilidade principal pela manutenção da paz e da segurança internacionais". Em poucos momentos essa responsabilidade foi sentida pelos membros do CS como tão pesada quanto nesta semana. De fato, em breve eles terão de fazer uma escolha decisiva.
A questão em jogo nessa escolha possui uma importância que não se limita ao Iraque: trata-se da ameaça que as armas de destruição em massa fazem pesar sobre a humanidade inteira. A comunidade internacional precisa agir em conjunto para frear a proliferação dessas armas temíveis, onde quer que ela aconteça.
De imediato, o mais urgente é fazer com que o Iraque não possua mais tais armas. Por quê? Porque já as utilizou no passado e porque por duas vezes, sob a égide do presidente atual, cometeu uma agressão contra seus vizinhos -contra o Irã, em 1980, e contra o Kuait, em 1990.
É por essas razões que o Conselho de Segurança decidiu eliminar essas armas no Iraque e, a partir de 1991, adotou resoluções sucessivas exigindo o desarmamento desse país.
Os povos do mundo inteiro desejam que esta crise seja resolvida por meios pacíficos. Eles estão extremamente preocupados com o imenso sofrimento humano que sempre acompanha a guerra, quer ela seja de duração longa ou curta. Além disso, temem as consequências de longo prazo que esta guerra, em especial, pode vir a ter.
Eles temem que a guerra gere crises econômicas e instabilidade na região e que, como é frequentemente o caso com as guerras, tenha consequências imprevistas que dêem lugar a novos perigos.
Será que ela tornará ainda mais difícil a luta contra o terrorismo ou a busca pela paz entre israelenses e palestinos? Será que semeará a discórdia profunda entre as nações e as populações de crenças diferentes? Pode ela comprometer nossa capacidade de trabalhar em conjunto para fazer frente a outros problemas comuns no futuro?
São dúvidas graves, e as respostas a elas precisam ser pensadas com cuidado.
Às vezes pode ser necessário recorrer à força para enfrentar ameaças à paz, e a carta da ONU prevê essa eventualidade. Entretanto a guerra deve sempre ser o último recurso. Não se deve recorrer a ela enquanto não tiverem sido tentadas todas as outras soluções razoáveis -no caso atual, unicamente se tivermos a certeza de que já tenham sido esgotados todos os meios pacíficos para assegurar o desarmamento do Iraque.
A Organização das Nações Unidas, fundada para "preservar as gerações futuras do flagelo da guerra", tem o dever de buscar uma solução pacífica até o último instante.
Terá esse momento chegado? É essa decisão que os membros do Conselho de Segurança terão de tomar agora.
A decisão é séria. Se eles não conseguirem chegar a um acordo em torno de uma posição comum e se alguns deles lançarem uma ação sem o aval do Conselho, a legitimidade dessa ação será amplamente questionada e ela não conseguirá o apoio político necessário para garantir seu êxito a longo prazo, uma vez concluída a fase militar.
Se, por outro lado, os membros do Conselho, apesar do pouco tempo que resta, conseguirem chegar a um entendimento quanto a uma linha de ação comum, para assegurar a aplicação de suas resoluções anteriores, então a autoridade do Conselho será reforçada, e o mundo ficará mais seguro.
Não devemos esquecer que a crise no Iraque não existe no vazio. Os acontecimentos nesse país terão repercussões profundas sobre outras questões de grande importância.
Quanto maior for o consenso em torno da abordagem a ser adotada, maiores serão nossas chances de podermos novamente nos unir e fazer frente, de maneira eficaz, a outros conflitos explosivos, a começar por aquele que opõe israelenses e palestinos. Todos nós sabemos que uma solução justa desse conflito pode trazer uma esperança real de estabilidade durável para a região.
Fora dos limites do Oriente Médio, o sucesso ou fracasso da comunidade internacional no que diz respeito ao Iraque vai incidir de maneira crucial sobre sua capacidade de intervenção nos acontecimentos não menos inquietantes na península coreana.
O trabalho realizado para solucionar conflitos que provocam tanto sofrimento na África será igualmente afetado, na medida em que as perspectivas de estabilidade e desenvolvimento às quais o continente aspira com tanta urgência correm o risco de ser comprometidas.
A guerra não é o único flagelo que o mundo precisa enfrentar. Quer eles busquem proteger-se contra o terrorismo ou estejam em luta contra as três chagas que são a pobreza, a ignorância e a doença, os países precisam trabalhar em conjunto e podem fazê-lo por intermédio da ONU.
Seja qual for a maneira pela qual a diferença atual se resolva, a ONU continuará a exercer um papel central, como exerce hoje. Devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance para que ela conserve sua unidade.
Nos últimos meses, pudemos constatar, em todas as partes do mundo, o imenso valor que não apenas os Estados, mas também os povos atribuem à legitimidade que conferem a ONU e o Conselho de Segurança, pelo fato de constituírem o quadro comum de consolidação da paz.
Agora que falta pouco para a grave decisão que eles deverão tomar nesta semana, espero que os países integrantes do Conselho de Segurança da ONU tenham em mente essa confiança sagrada que os povos do mundo inteiro depositaram neles e que se mostrem dignos dela.