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Inclusão digital é a melhor saída para ampliar mercado

Por Gazeta Mercantil    19 de março de 2003
Estimativas mostram que somente 10% dos lares dispõem de um computador, mas nessa base instalada o acesso à internet é ínfimo

Rosana Hessel e Cristina Borges Guimarães



Empresas e governos têm propostas e experiências positivas; base instalada de computadores aumenta no Brasil, mas um grande potencial de negócios ainda é pouco aproveitado. A exclusão digital é uma praga. Limita o mercado de tecnologia da informação no Brasil. Cria um novo padrão de desigualdade. Impede o acesso da maioria da população a uma inesgotável fonte de conhecimentos. Estimativas mostram que somente 10% dos lares dispõem de um computador, mas nessa base instalada o acesso à internet é ínfimo. Um grande potencial de desenvolvimento e de negócios tem sido pouco aproveitado.

O quadro vem mudando gradualmente. Há casos de sucesso envolvendo a iniciativa privada ou até mesmo governos. Mas a renovação é lenta. Um levantamento feito pelo professor Fernando Meirelles, vice-diretor da Fundação Getúlio Vargas e Escola de Administração de Empresas de São Paulo (FGV/Eaesp), aponta que 10 em cada 100 computadores do País têm acesso à internet, número igual à média mundial.

Entre 2000 e 2001, quando Meirelles fez o último levantamento, o índice brasileiro era de 8 em cada 100 computadores e o mundial, 7. A média mundial cresceu mais rápido. A venda de computadores no Brasil e no mundo apresentou uma queda inédita no ano passado. Mas os efeitos dessa retração são mais graves nessa parte do planeta, onde se espera que novos consumidores entrem no mercado.

Preços em queda

O preço dos computadores, em dólar, está em queda, mas o equipamento, segundo Meirelles, ainda está longe de se tornar uma commodity, como a televisão e o telefone. O preço médio dos computadores caiu 15% ao ano nos últimos 15 anos. "Em reais essa queda não é equivalente, principalmente em função da desvalorização cambial, mas o preço vem caindo", diz. O problema é o baixo índice de nacionalização das máquinas - a maioria dos componentes é importada. Em fevereiro de 2002, um computador com processador Intel Celeron de 1.3 GHz, 128 MB de memória e sistema operacional Windows XP, custava entre R$ 1.890 a R$ 2.300 no grande varejo convencional ou online. Hoje, um computador da mesma marca, com configuração semelhante, chega a custar R$ 2.899. Ou seja, um aumento de 53%, enquanto o real desvalorizou 31,53% frente ao dólar no mesmo período. Enquanto isso, o projeto do computador popular de R$ 500, lançado há pouco mais de dois anos, não saiu da prancheta. Alguns protótipos chegaram a ser feitos, mas não foram comercializados, informa o Ministério das Comunicações.

De acordo com dados do Comitê de Democratização da Informática (CDI), com base em um levantamento da Fundação Getúlio Vargas do Rio (FGV/RJ) com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 26,496 milhões de brasileiros têm acesso à internet de alguma forma, ou seja, 17,7% da população. Conclui-se, com isso, que 149,445 milhões de cidadãos ainda não estão incluídos digitalmente. "A inclusão digital envolve uma mudança cultural e para isso um longo tempo é necessário. Nada é imediato", diz o gerente de tecnologia e de projetos da consultoria Roland Berger & Partners, Alessandro Fontenelle.

Essa realidade foi sentida pela Stefanini com a experiência na comunidade da favela Vila Dalva, na Zona Oeste de São Paulo. A empresa investiu na criação de um centro de profissionalização em informática dentro da favela voltado para atender crianças pobres há 1,5 ano. Com a convivência, o instituto descobriu a necessidade de prestar outros tipos de serviços além da formação profissional. Hoje a entidade oferece também cursos de inglês, português e até de etiqueta além de palestras para melhorar a autoestima dos alunos. Não é só o preço do computador que separa o brasileiro do mundo digital. Há também antigos problemas de educação básica.

Conforme dados levantados pela Roland Berger, a penetração da internet gira em torno de 6% da população, o que dá ao Brasil a 33 posição no ranking mundial. Enquanto isso, a liderança está com o Canadá - país com a população menor que o estado de São Paulo -, com cerca de 50% da população conectada, seguida de perto pela Suécia (49,6%) e Estados Unidos (48,8). No Brasil, São Paulo detém 36% dos usuários, e, em segundo lugar está o Rio de Janeiro, com 15%.

Distribuição de renda

"Um crescimento acima de 10% na base de usuários é esperado, mas concentrado nas classes A e B, porque o custo da internet discada representa cerca de 13% do orçamento das classes C e D", diz Fontenele. "O crescimento da penetração deverá depender, em parte, de uma melhor distribuição de renda e do aumento ao acesso a PCs por parte da população."

Alguns trabalhos vêm sendo feitos por grandes multinacionais do segmento de TI, como Hewlett-Packard, Microsoft, Sun Microsystems, EDS, Intel e IBM, que contam, hoje, com executivos cuja preocupação é definir investimentos em programas de inclusão social. Há casos de experiências frutíferas com Organizações Não-Governamentais (ONGs), como CDI, Instituto Ayrton Senna, Projeto Aprendiz e Meninos do Morumbi. Essas iniciativas garantem uma imagem de responsabilidade social para as empresas e têm efeitos práticos positivos. "Essas iniciativas visam não somente reduzir a exclusão digital mas também assegurar um mercado futuro", diz Meirelles. Trata-se, afinal, de um trabalho de desenvolvimento de mercado.

A HP conta com a premiada Garagem Digital, que formou 120 jovens da favela do bairro do Morumbi, em São Paulo, no ano passado, mas teve problemas em sua formatação. "No início não nos preocupamos em buscar empregar os alunos, apesar de alguns terem conseguido emprego ou mesmo montado uma microempresa de webdesign", diz o coordenador do comitê de responsabilidade social da HP, Juarez Zortea.

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