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Rio tem 35 pontos de risco ambiental e uma fiscalização falha

Por O Globo    13 de maio de 2003
O vigilante Adilson da Costa diz que a água do poço artesiano de sua casa, no bairro de Santo Expedito, em Queimados, tem todas as cores do arco-íris e um cheiro forte. Ele não sabe, mas é mais uma vítima do descaso do poder público em áreas de alto risco ambiental. A poucos metros de seu terreno, no local onde um dia funcionou o Centro de Tratamento de Resíduos (Centres), 20 mil toneladas de produtos tóxicos entulhados em tambores enferrujados e sem tampa e numa lagoa de resíduos estão abandonados. Uma chuva é suficiente para arrastar os metais pesados até a casa de Adilson. A ameaça ambiental de Queimados é apenas um dos 35 focos de risco potencial no estado levantados pelas comissões de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa e da Câmara Municipal do Rio, e não divulgados até hoje pela Feema. Dezoito pontos encontram-se na Região Metropolitana.

Feema não se pronuncia sobre omissão na fiscalização

O deputado estadual André do PV e o vereador Rodrigo Bethlem, presidentes das respectivas comissões e filiados ao Partido Verde, dizem que a ameaça surge por causa das falhas na fiscalização pelo poder público das zonas críticas listadas. André responsabiliza a Feema:

- A diretoria do órgão incorre em crime de omissão por não fiscalizar as áreas de risco potencial apontadas no estudo. A falha pode gerar bombas-relógio, como o Centres, que está prestes a explodir.

O deputado afirma que listou os principais focos de risco, mas só a Feema poderia divulgar uma lista completa, pois detém as informações ambientais do estado. A presidente do órgão, Isaura Fraga, afirmou em palestra na Firjan que já teria a relação dos pontos de risco ambiental do estado. O Globo solicitou o levantamento há 15 dias, mas a assessoria da Feema informou que o mesmo ainda não estava pronto. Semana passada, o jornal voltou a procurar Isaura e o secretário estadual de Meio Ambiente, Luiz Paulo Conde. Nenhum dos dois quis se pronunciar sobre a lista das comissões ambientais.

O problema no Centres ilustra bem o descaso do poder público. Segundo inquérito instaurado na Delegacia de Proteção ao Meio Ambiente, desde 1999 a Feema é instada a tomar providências no local. O órgão, à época, informou que o material seria retirado do local. Nada foi feito, de acordo com Rosemberg Sousa, presidente da ONG Grupo de Defesa Ambiental (GDA), que passou a cuidar da área desde 2000 para evitar que o depósito fosse invadido.

- A Petrobras já se dispôs a limpar a área, mas a autorização ainda não foi dada pela Feema. A burocracia emperra esse processo, e o mais absurdo é que o próprio órgão tem 100 toneladas de resíduos tóxicos no local, trazidos de autuações. Não liberam a limpeza e ainda poluem - ataca Rosemberg.

A omissão da Feema está prevista na Lei de Crimes Ambientais. A promotora Rosani da Cunha Gomes, da 2 Promotoria de Meio Ambiente da Capital, diz que se o conjunto de fatos apresentados revelar um risco potencial ao meio ambiente, o estado pode ser responsabilizado :

- Basta que se configure realmente a omissão. Em tese, pode haver responsabilidade civil e criminal por esses atos.

Não faltam casos graves. O vazamento crônico de zinco e cádmio da Ingá Mercantil e a ocupação irregular de lixões no Aterro de Gramacho são exemplos. O ambientalista Rogério Zouein, da ONG Grupo de Ação Ecológica, explica que a omissão deve ser levantada ponto a ponto, para que as grandes indústrias não escapem da malha fina.

- A pressão política exercida sobre a Feema impede a fiscalização de grandes indústrias poluidoras. Elas não cumprem os termos da licença ambiental e, mesmo sendo um risco para o estado, não são devidamente monitoradas pelo órgão competente - acusa Zouein.

Há ameaças crônicas também na cidade. Na última sexta, O GLOBO fotografou manchas escuras nas lagoas da Baixada de Jacarepaguá. A maior estava próxima ao BarraShopping, onde há um tubulão de esgoto. O problema ali é com a Cedae, que não fiscaliza o funcionamento de estações de tratamento particulares da região:

- Essas lagoas são vítimas de fontes crônicas de impacto ambiental, como lançamentos de esgotos domésticos e industriais, e o assoreamento provocado pela ocupação das encostas e margens de rios - diz a diretora da ONG Ecomarapendi, Vera Chevalier.

Vereador diz que município também é culpado

No município, segundo Rodrigo Bethlem, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente, pleiteia na Justiça o direito de conceder licenças ambientais sem ter sequer condição de fiscalizar os pontos existentes:

- Primeiro, eles devem se preocupar em realizar ações preventivas de fiscalização.

O secretário municipal de Meio Ambiente, Ayrton Xerez, rebateu as críticas de Rodrigo afirmando que dispõe de uma equipe de 150 técnicos:

- Temos cinco escritórios técnicos de fiscalização já funcionando no município. Para incrementar as ações ambientais, precisamos ser habilitados.

Enquanto as questões ambientais seguem emperradas por questões políticas, o vigilante Adilson, que tem água contaminada, preferiu não esperar: mandou fechar definitivamente seu poço artesiano, e agora espera carros-pipa. Ele não quer ter o mesmo fim dos 17 vizinhos, num universo de duas mil pessoas, que morreram de câncer, coincidentemente, após o início da contaminação do lençol freático da região.

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