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Teatro promove a inclusão social de jovens e idosos em Carapicuiba
Na verdade, está é mais uma aula do Projeto Teatralizando na Melhor Idade, que pretende trabalhar o teatro como inclusão social do idoso. A atividade é idealizada e comandada pelo voluntário e ator Alexandre Pasqüelli e reúne, todos os domingos, há dois meses, um grupo de, em média, 15 pessoas. Entre o aquecimento corporal e vocal, jogos cênicos, travas-línguas e situações simuladas, a proposta é mostrar que o teatro pode ser mais do que apenas diversão, ao abrir novos horizontes e possibilidades. "O legado maior do idoso é a experiência de vida deles e o teatro valoriza isso", comenta Alexandre.
A idéia da atividade, que é uma extensão do Projeto Teatralizando o Saber, realizado com crianças e jovens, pela atriz, educadora e noiva de Alexandre, Leda Ferreira, apareceu depois de um estudo realizado por ele no início deste ano. Alexandre levantou dados a respeito de atividades voltadas para os idosos em instituições como Sesc e Sesi a fim de conhecer quais eram as necessidades reais dos idosos. Foi feito um trabalho experimental numa organização e levada para o NUPI. Em sua pesquisa, o voluntário avaliou que apesar de ter aumentado o número de atividades voltadas para a terceira idade, elas estão espalhadas em locais muitas vezes distantes da comunidade. Por isso a proposta de trazer para os bairros, ações culturais como o Teatralizando.
Neste primeiro momento o grupo está entrando em contato com o universo teatral e tudo o que envolve essa expressão artística. Assim, as atividades envolvem sempre muita criatividade como em tarefas em que os participantes precisam imaginar novos significados a um objeto qualquer. Até aqueles que acabaram de chegar, como aconteceu com Divina de Souza, 73 anos, no último domingo, têm que deixar a timidez de lado e soltar a imaginação. Divina, que estava muito acanhada e no começo queria apenas observar, foi convidada a participar da atividade e se envolver em uma situação inventada por Alexandre.
Depois de muitas gargalhadas, o comportamento dela era totalmente outro. "Teatro é brincar de fazer de conta de novo, como quando éramos crianças e brincávamos de boneca", avalia a senhora, que reclama do preconceito que muitas pessoas têm ao acharem que idosos não podem e não sabem fazer mais nada. "Muitos se encolhem em casa. Mas já tivemos a nossa vida e agora queremos fazer o que quisermos", completa Divina que pretende voltar de novo.
Apesar do pouco tempo das atividades, Alexandre já percebe uma grande mudança na postura do grupo e garante que a transformação que o teatro provoca na vida das pessoas é sempre rápida. O voluntário conta que ao contrário do que ocorria nas primeiras aulas, em que as participantes permaneciam sempre com a bolsa no corpo, mostrando que não estavam à vontade, o comportamento agora é totalmente diferente. Uma unidade parece já estar se formando. "Isso começa a se refletir no corpo, na forma de se expressar, falar e pensar. Com os exercícios, fica mais apto à comunicação".
E não é somente um especialista que consegue apontar esse novo comportamento. Eles mesmos gostam de "dedurar" aquele que, antes carrancudo e rabujento, ganhou muito mais a simpatia dos vizinhos. Alfredo Gonçalves, 64 anos, é prova disso. Apesar de ser pai de Alexandre, até há pouco tempo não fazia parte de seus planos incluir o teatro em sua vida. Ele achava "perda tempo". Hoje, além de fazer parte do Teatralizando, Alfredo é ator da Cia Municipal de Teatro de Carapicuíba e está se apresentando em escolas com o grupo. Hoje, ele não vê a hora de chegar o próximo espetáculo. O filho aproveita a ocasião para ressaltar outros benefícios da atividade, como a melhora na memória.
Mas não era somente Alfredo que tinha essa opinião sobre o teatro. Por falta de oportunidade e até informação, todos achavam que o teatro era algo muito distante. Leonor Generoso, 67, conta que nunca imaginou participar de atividades como essa, mas hoje já sonha com o dia em que irá subir num palco e se apresentar para uma grande platéia. Até Cleusa Benedito Soares, 61, que achava tudo muito sem graça agora não fica um domingo sem participar. "Quem não vêm, não sabe o que está perdendo. Aqui a gente se desinibe", comenta a presidente do NUPI, Dagmar Ribeiro Navarro, que aponta melhoras também na sua fala e locomoção, já que no ano passado foi vítima de um Acidente Vascular Cerebral.
Em breve, Alexandre pretende começar a trabalhar também com textos, dando prioridade a temas que envolvem a questão do idoso. A idéia é "usar o teatro parar dizer outras coisas, não só pelo entretenimento. Não importa como você vai falar, mas você vai falar", acredita o voluntário. Desta forma, o projeto pretende preparar até o final do ano um espetáculo, trazendo a experiência de vida deles e levando isso para outros espaços. O objetivo é formar um grupo que represente o NUPI em apresentações.
Para todas as idades
"O teatro não tem idade. Ele pode acontecer em qualquer lugar". É com essa idéia em mente que o Projeto Teatralizando o Saber teve início em 2002, inicialmente com a proposta de atender crianças e jovens na escola. Na época, Leda Ferreira era educadora da EMEF Levy Gonçalves de Oliveira, em Barueri (grande São Paulo), e começou a realizar um curso de teatro com um grupo de 15 crianças de oito anos. O objetivo do projeto, segundo a atriz, é trabalhar com dificuldades que as crianças enfrentam, como produção de texto, imaginação e principalmente a oralidade, além da auto estima e a desibinição, já que estes fatores podem dificultar a aprendizagem.
As aulas englobavam disciplinas como História do teatro, Expressão vocal, Expressão corporal, Interpretação e Improvisação e foram realizadas durante todo o ano passado. Leda lembra que o rendimento escolar dos participantes melhorou muito, e eles passaram a ter mais facilidade para trabalhar em grupo e criar. A educadora teve de enfrentar algumas dificuldades no início, devido a problemas de relacionamento entre os alunos. "Havia discriminação e aquela coisa de não querer pegar na mão do colega. E o teatro tem esse contato físico muito forte. Fui trabalhando isso. Depois, teve um dado momento que eles mesmos cobravam esse contato", afirma.
Além deste trabalho, a atriz deu início ao Teatralizando no IEPPC (Instituto Educacional e Profissional Parque dos Camargos), também em Barueri, sendo este o seu primeiro projeto como voluntária. Durante todo o ano, um grupo de 15 jovens participaram das atividades e "adotaram" a educadora também como terapeuta. "Eles falavam tudo para mim e isso é muito complicado. Mas todos eram muito amorosos". Wilson Marques do Prado, 18, foi um dos jovens que deu os seus primeiros passos no teatro por meio do projeto.
O garoto tinha na época um sonho de montar uma banda e acreditava que o teatro poderia ajudá-lo a lidar com o público. "No começo tinha muita vergonha e isso foi passando com o tempo. Mas hoje, se precisar tocar para um monte de pessoas, não vou ficar tão abalado como na primeira vez", relembra. Isso porque, quando subiu no palco para apresentar uma peça preparada pelo grupo, Wilson conta que "seu coração quase saiu pela boca de tanto nervoso". "Mas foi muito legal. No final do curso, estávamos muito mais próximos".
Nas próximas semanas, Leda vai começar a desenvolver o projeto também como voluntária na Escola Municipal Professor João Campestrini, em Osasco (grande São Paulo), com crianças de 10 anos. O processo será semelhante ao que foi desenvolvido nos dois outros locais, sempre trabalhando primeiramente com jogos cênicos, criatividade e oralidade, antes do grupo estar pronto para enfrentar uma platéia. Segundo a atriz, essa é a diferença entre o curso que desenvolve e apenas a montagem de uma peça teatral. Todo o projeto busca fazer um resgate cultural brasileiro trazendo, por exemplo, para os espetáculos, canções antigas e de cantores que marcam época.
Projeto Teatralizando