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Equoterapia: nova vida aos praticantes
Por Wladimir Miranda / Diário do Comércio   15 de abril de 2004
Fundação Selma, especializada na recuperação de deficientes, aposta nessa terapia também para autistas e em distúrbios de aprendizagem
Sem nenhuma ajuda do governo, seja municipal, estadual ou federal, a Fundação Selma, localizada no bairro de Campo Belo, na zona sul, já recuperou milhares de deficientes físicos para a vida social. A entidade tem na cura à base da equoterapia –emprego da montaria a cavalo na recuperação física–, a sua maior especialidade.
"Não temos nenhuma ajuda governamental. Sobrevivemos com o dinheiro arrecadado em eventos, bazares, campanhas beneficentes e com a ajuda dos pacientes que podem pagar. Aqui, quem tem dinheiro ajuda no tratamento dos que não têm", avisa Eduardo Carvalho, diretor superintendente da fundação.
O ex-ator da Rede Globo Gerson Brenner é um dos "adotados" pelos pacientes de maior poder aquisitivo. De cadeira de rodas, empurrada pelo pai, Arnaldo Santos Oliveira –que conseguiu a sua guarda definitiva, após uma árdua disputa judicial com a ex-mulher do ator, a bailarina Denise Tacto–, Gerson Brenner vai duas vezes por semana ao casarão da Fundação Selma. Lá, faz tratamentos de hidroterapia e equoterapia. Aos 44 anos, ele luta contra a hemiplegia, ausência de movimentos num dos lados do corpo.
Dia 17 de agosto de 1998, Gerson Brenner, que fazia sucesso como o "Jorginho", personagem da novela "Corpo Dourado", ia sozinho para o Rio de Janeiro dirigindo seu Golf verde, para gravar o último capítulo do folhetim. No início da madrugada, no quilômetro 13,9 da SP-060, que liga a rodovia Ayrton Senna à Via Dutra, em Guararema, foi baleado na cabeça por assaltantes. A bala atravessou o osso frontal, perfurou o hemisfério esquerdo do cérebro e se alojou no couro cabeludo, acima da nuca, a região occipital.
Brenner perdeu massa encefálica, ficou com o lado direito do corpo paralisado. Também sofreu fraturas dos ossos frontal, parietal e occipital. Submeteu-se a uma cirurgia que durou mais de quatro horas.
Mais sofrimento ainda estava reservado para o ator. Menos de um ano depois, ele perdeu a mãe. O choque da perda o levou de volta para o hospital, agora com crises convulsivas. Ainda não tinha conseguido superar a dor, quando viu começar na justiça uma intensa batalha envolvendo as pessoas que mais amava: seus pais, a irmã Cristina e a mulher Denise Tacto. Brigavam pela sua guarda.
Denise perdeu a briga na justiça e saiu de cena. Com a guarda definitiva do filho, Arnaldo se recusa a responder a qualquer pergunta sobre Denise que, para ele, foi cruel demais com Brenner. O ator foi proibido pela ex-mulher de ver a filha do casal, Vitória de cinco anos. Na opinião de Denise, Gerson Brenner não reúne condições de dar afeto à filha. O ex-ator, que não fala, mas compreende tudo o que acontece ao seu redor, sofre muito com a ausência de Vitória.
Arnaldo prefere falar sobre as sessões de fisioterapia, hidroterapia e equoterapia a que o filho se submete. "Não quero falar do passado. Eu e meu filho queremos olhar para a frente", diz.
"O Gerson só anda com andador. Estamos fazendo um trabalho de equilíbrio e de força muscular com ele. Ficou muito mais confiante depois que começou a fazer equoterapia", diz o fisioterapeuta Leandro Galaverna Costa.
Gerson faz tratamento de fisioterapia, hidroterapia e equoterapia desde de agosto de 2001. O tiro que levou na cabeça afetou a sua fala. "Tudo que aconteceu com o Gerson, a briga judicial com a mulher e a perda da mãe, afetou muito a sua evolução. Se tivesse começado o tratamento rápido, teria mais chances de se recuperar", diz Luiz Eduardo Carvalho, superintendente da clínica.
Trágica também é a história do engenheiro de produção Luiz Carlos Braga Marques da Silva, de 28 anos. Em novembro de 99, voltava de uma festa no interior de São Paulo com três amigos, quando seu carro capotou na serra de Amparo. "Perdi o controle do carro. Fraturei a 11ª e a 12ª vértebras. Perdi os movimentos do meio da coxa para baixo. Graças a Deus meus amigos não sofreram nada. Eu fiquei paraparético", conta.
Ao contrário de Gerson Brenner, Luiz Carlos teve paz para iniciar o tratamento e fala com entusiasmo da equoterapia. "Estou aqui há três anos. Não parei de melhorar neste período. Antes, não tinha equilíbrio nenhum, não conseguia nem dirigir. Na curva, achava que ia tombar. A equoterapia me deu segurança", afirma ele que, bem informado sobre o seu problema, revela que prepara-se para fazer o mesmo tratamento que está sendo feito pelo ator Christopher Reeve, o Super-Homem das telas, que ficou tetraplégico depois de cair de um cavalo há oito anos, durante um evento equestre.
Algoz para Christopher Reeve, o cavalo tem sido a salvação para Luiz Carlos. A equoterapia é um tratamento terapêutico reconhecido pelo CRM (Conselho Regional de Medicina). "O cavalo proporciona ganhos motores e psicológicos. Ele é indicado para tratamentos de lesões motoras como o TCE (Trauma Crânio Encefálico) e o AVC (Acidente Vascular Cerebral) e casos neurológicos como a paralisia cerebral", diz a psicopedagoga Liana Pires Santos.
A equoterapia também tem obtido sucesso no tratamento de autismo, síndromes, distúrbios de aprendizagem, déficit de atenção, psicose, depressão e dependência química. "O cavalo está relacionado com disciplina. Proporciona ritmo, método, atenção. Ele tem um movimento tridimensional. Durante o passo, ele provoca uma instabilidade nos três vetores de força. Para cima e para baixo, de um lado para outro e de frente para trás. Mais: o cavalo aumenta a estima da pessoa. Na cadeira de rodas, o deficiente olha para as pessoas de baixo para cima. No cavalo, ela olha de cima para baixo", exemplifica Liana.
Foram também muitos os benefícios que a equoterapia propiciou a Edvan Rachid, de 32 anos. "Cheguei aqui numa cadeira de rodas. Graças ao trabalho com o cavalo e à hidroterapia eu já consigo andar", diz ele, que há um ano luta contra um AVE (Acidente Vascular Encefálico). Entusiasmado com o sucesso do tratamento, planeja recomeçar os estudos na faculdade de publicidade.
Quem faz o tratamento de equoterapia nunca é chamado de paciente. É praticante. Não fica sozinho durante os exercícios. Sempre tem ao lado um fisioterapeuta, um psicólogo, um fonoaudiólogo e um profissional de educação física.
Sem nenhuma ajuda do governo, seja municipal, estadual ou federal, a Fundação Selma, localizada no bairro de Campo Belo, na zona sul, já recuperou milhares de deficientes físicos para a vida social. A entidade tem na cura à base da equoterapia –emprego da montaria a cavalo na recuperação física–, a sua maior especialidade.
"Não temos nenhuma ajuda governamental. Sobrevivemos com o dinheiro arrecadado em eventos, bazares, campanhas beneficentes e com a ajuda dos pacientes que podem pagar. Aqui, quem tem dinheiro ajuda no tratamento dos que não têm", avisa Eduardo Carvalho, diretor superintendente da fundação.
O ex-ator da Rede Globo Gerson Brenner é um dos "adotados" pelos pacientes de maior poder aquisitivo. De cadeira de rodas, empurrada pelo pai, Arnaldo Santos Oliveira –que conseguiu a sua guarda definitiva, após uma árdua disputa judicial com a ex-mulher do ator, a bailarina Denise Tacto–, Gerson Brenner vai duas vezes por semana ao casarão da Fundação Selma. Lá, faz tratamentos de hidroterapia e equoterapia. Aos 44 anos, ele luta contra a hemiplegia, ausência de movimentos num dos lados do corpo.
Dia 17 de agosto de 1998, Gerson Brenner, que fazia sucesso como o "Jorginho", personagem da novela "Corpo Dourado", ia sozinho para o Rio de Janeiro dirigindo seu Golf verde, para gravar o último capítulo do folhetim. No início da madrugada, no quilômetro 13,9 da SP-060, que liga a rodovia Ayrton Senna à Via Dutra, em Guararema, foi baleado na cabeça por assaltantes. A bala atravessou o osso frontal, perfurou o hemisfério esquerdo do cérebro e se alojou no couro cabeludo, acima da nuca, a região occipital.
Brenner perdeu massa encefálica, ficou com o lado direito do corpo paralisado. Também sofreu fraturas dos ossos frontal, parietal e occipital. Submeteu-se a uma cirurgia que durou mais de quatro horas.
Mais sofrimento ainda estava reservado para o ator. Menos de um ano depois, ele perdeu a mãe. O choque da perda o levou de volta para o hospital, agora com crises convulsivas. Ainda não tinha conseguido superar a dor, quando viu começar na justiça uma intensa batalha envolvendo as pessoas que mais amava: seus pais, a irmã Cristina e a mulher Denise Tacto. Brigavam pela sua guarda.
Denise perdeu a briga na justiça e saiu de cena. Com a guarda definitiva do filho, Arnaldo se recusa a responder a qualquer pergunta sobre Denise que, para ele, foi cruel demais com Brenner. O ator foi proibido pela ex-mulher de ver a filha do casal, Vitória de cinco anos. Na opinião de Denise, Gerson Brenner não reúne condições de dar afeto à filha. O ex-ator, que não fala, mas compreende tudo o que acontece ao seu redor, sofre muito com a ausência de Vitória.
Arnaldo prefere falar sobre as sessões de fisioterapia, hidroterapia e equoterapia a que o filho se submete. "Não quero falar do passado. Eu e meu filho queremos olhar para a frente", diz.
"O Gerson só anda com andador. Estamos fazendo um trabalho de equilíbrio e de força muscular com ele. Ficou muito mais confiante depois que começou a fazer equoterapia", diz o fisioterapeuta Leandro Galaverna Costa.
Gerson faz tratamento de fisioterapia, hidroterapia e equoterapia desde de agosto de 2001. O tiro que levou na cabeça afetou a sua fala. "Tudo que aconteceu com o Gerson, a briga judicial com a mulher e a perda da mãe, afetou muito a sua evolução. Se tivesse começado o tratamento rápido, teria mais chances de se recuperar", diz Luiz Eduardo Carvalho, superintendente da clínica.
Trágica também é a história do engenheiro de produção Luiz Carlos Braga Marques da Silva, de 28 anos. Em novembro de 99, voltava de uma festa no interior de São Paulo com três amigos, quando seu carro capotou na serra de Amparo. "Perdi o controle do carro. Fraturei a 11ª e a 12ª vértebras. Perdi os movimentos do meio da coxa para baixo. Graças a Deus meus amigos não sofreram nada. Eu fiquei paraparético", conta.
Ao contrário de Gerson Brenner, Luiz Carlos teve paz para iniciar o tratamento e fala com entusiasmo da equoterapia. "Estou aqui há três anos. Não parei de melhorar neste período. Antes, não tinha equilíbrio nenhum, não conseguia nem dirigir. Na curva, achava que ia tombar. A equoterapia me deu segurança", afirma ele que, bem informado sobre o seu problema, revela que prepara-se para fazer o mesmo tratamento que está sendo feito pelo ator Christopher Reeve, o Super-Homem das telas, que ficou tetraplégico depois de cair de um cavalo há oito anos, durante um evento equestre.
Algoz para Christopher Reeve, o cavalo tem sido a salvação para Luiz Carlos. A equoterapia é um tratamento terapêutico reconhecido pelo CRM (Conselho Regional de Medicina). "O cavalo proporciona ganhos motores e psicológicos. Ele é indicado para tratamentos de lesões motoras como o TCE (Trauma Crânio Encefálico) e o AVC (Acidente Vascular Cerebral) e casos neurológicos como a paralisia cerebral", diz a psicopedagoga Liana Pires Santos.
A equoterapia também tem obtido sucesso no tratamento de autismo, síndromes, distúrbios de aprendizagem, déficit de atenção, psicose, depressão e dependência química. "O cavalo está relacionado com disciplina. Proporciona ritmo, método, atenção. Ele tem um movimento tridimensional. Durante o passo, ele provoca uma instabilidade nos três vetores de força. Para cima e para baixo, de um lado para outro e de frente para trás. Mais: o cavalo aumenta a estima da pessoa. Na cadeira de rodas, o deficiente olha para as pessoas de baixo para cima. No cavalo, ela olha de cima para baixo", exemplifica Liana.
Foram também muitos os benefícios que a equoterapia propiciou a Edvan Rachid, de 32 anos. "Cheguei aqui numa cadeira de rodas. Graças ao trabalho com o cavalo e à hidroterapia eu já consigo andar", diz ele, que há um ano luta contra um AVE (Acidente Vascular Encefálico). Entusiasmado com o sucesso do tratamento, planeja recomeçar os estudos na faculdade de publicidade.
Quem faz o tratamento de equoterapia nunca é chamado de paciente. É praticante. Não fica sozinho durante os exercícios. Sempre tem ao lado um fisioterapeuta, um psicólogo, um fonoaudiólogo e um profissional de educação física.