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Respeito às culturas e religiões

Por Comunicação REBRAF / DEGRAU   18 de abril de 2006
(Transcrevemos artigo publicado no DC 13/2 /06 que certamente há de interessar a muitas das nossas entidades que trabalham com diversidade cultural e religiosa).

Nos últimos dias vimos partes do mundo incendiadas e ensangüentadas por causa de um pretendido direito à liberdade de expressão. Via de regra os proprietários dos meios de comunicação - ou os seus prepostos - entendem o direito à livre expressão unilateralmente, isto é, o direito de dizerem o que desejarem. Nunca pensam que o direito de informação e de expressão é um direito de mão dupla, também do povo. Lembram-se do movimento das "Diretas-Já"? Houve quem proibisse a repercussão do movimento em suas telas.

É claro que nada justifica uma reação ensandecida em face do que foi considerado vilipêndio à religião islâmica, ou seja, a representação grotesca do profeta Muhammad. O que de certo modo é novo para os muçulmanos, é antiqüíssimo para os cristãos. No século III, no chão de mármore de um quartel romano, Jesus Cristo foi caricaturado na forma de um asno crucificado, como ainda hoje se pode constatar no Museu Nacional das Termas, em Roma.

O escárnio das religiões não é um fato novo, mas ele recrudesce em certas ocasiões, como verificamos ultimamente, quando as religiões são abordadas com descaso. Recente sintoma disso foi o desmedido destaque dado, encabeçado obviamente pelo Fantástico, às manifestações de desequilíbrio psíquico de um clérigo de Salvador.

O que parece ser sistemático no hemisfério norte reverbera entre nós, quando alguns intelectuais se mostram incapazes de compreender o fenômeno religioso. Pior ainda é quando encontramos especialistas que se comprazem em julgar soberbamente a religião dos pobres, outrora alcunhada de “ópio do povo”, nos tempos em que o marxismo gozava do status de paradigma irrefutável. Ou quando se discute, esmiúça, disseca, sabatina, argüi, esquadrinha a religião, às vezes por nunca ter crido ou não saber direito o que é a fé, outras vezes por não crer mais, ou até por pura preguiça de crer.

O fenômeno religioso é extenso demais, no tempo e no espaço, para merecer tratamento superficial ou apressadamente urdido nos esquemas inflexíveis dos variados sistemas ideológicos, muitos deles importados de realidades totalmente diferentes da nossa.

Dada a complexidade de um fenômeno, seria salutar que os que trabalham com os critérios industriais e competitivos da elaboração de noticiários se resguardassem de manifestar afoitadamente o que pensam, na Dinamarca e fora de lá. Pode ser que eles desencadeiem, mesmo sem o desejarem, um processo de desastrosas conseqüências. Um dia ainda vamos rir de nós mesmos, por termos sido tão burlescos, tão lineares e rígidos na abordagem da complexidade. Se somos todos filhos do cosmos, se trazemos em nós o mundo biológico e psicológico, não nos esqueçamos que o trazemos em singularidades próprias. O nosso mundo não é só ocidente, é preciso que a liberdade de expressão não faça tabula rasa - na época da rapidez da transmissão do texto e da imagem - de quem tem outra cosmovisão, outra ética, outra estética, outra lógica, outra sensibilidade.

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