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37 mil assinaturas pedem respeito do governo

Por Paula Cunha    20 de setembro de 2006
Defender as entidades e organizações de assistência social e, conseqüentemente, todo o Terceiro Setor. Este é o objetivo da Moção de Respeito ao Terceiro Setor, carta elaborada e entregue ontem ao governo federal para protestar contra a nova minuta de Decreto do Governo Federal que tem novas regras para regulamentar a concessão, renovação e cancelamento do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas). Organizações do setor protestam contra as medidas, que tornam sua atuação inviável, e a falta de discussão entre o governo e elas sobre seus principais pontos. A Rede Brasileira de Entidades Assistenciais e Filantrópicas (Rebraf) entregou e protocolou ontem um abaixo-assinado com mais de 37 mil assinaturas e uma Moção de Respeito ao Terceiro Setor em Brasília na Casa Civil, para a ministra Dilma Rousseff e para o Conselho Nacional de Assistência Social.

Para o diretor-secretário da Rede Brasileira de Entidades Assistenciais e Filantrópicas (Rebraf), Clodoaldo de Lima Leite, é fundamental que este processo de tramitação da lei seja interrompido agora para que a sociedade civil possa discutir o assunto porque muitos itens da nova minuta inviabilizam a atuação das entidades assistenciais. "Ela fere a Lei de Assistência Social, que diz que a sociedade civil tem que exercer o controle social não só sobre os gastos públicos, mas também sobre os impactos das políticas públicas", explica.

Até o início da semana, o documento já continha 35 mil assinaturas e, segundo Leite, o Conselho Municipal de Assistência Social (Comas) de São Paulo também já havia se posicionado contra o projeto.

Na avaliação do diretor-secretário da Rebraf, esta tentativa do governo de "melhorar" a lei fere a Carta Magna, principalmente nos artigos 1o. e 3o. , e a própria Lei Orgânica de Assistência Social. "O projeto do governo contempla algumas coisas da legislação em vigor, mas acaba inviabilizando as entidades de assistência social", explica.

Vulnerabilidade e risco social – Como exemplo, ele cita o artigo 2o. da minuta do decreto, que diz que a assistência social deve ser destinada a quem está em situação de vulnerabilidade e risco social, ou seja, as pessoas que têm renda inferior a meio salário mínimo. Leite aponta uma grave contradição neste enunciado porque, pela lei, ninguém pode receber menos de um salário mínimo.

Ele segue apontando outras contradições além desta. De acordo com a legislação atual, entidade beneficente é aquela que protege a família, a maternidade, a infância e a velhice desamparada, apoiando crianças e adolescentes carentes, promovendo ações de prevenção, habilitação e reabilitação de pessoas com deficiência, assistência educacional ou de saúde, e promovendo a integração no mercado de trabalho.

Pelo novo decreto, beneficente é a entidade que atende quem está em vulnerabilidade e em risco social (artigo 2). Ele continua, afirmando que a entidade deve proporcionar os mínimos necessários nas áreas de educação saúde e assistência social. Considera-se em vulnerabilidade social aquele que tem renda inferior a meio salário mínimo. Na análise da Rebraf isto é inconstitucional, pois educação, saúde e assistência social são direito de todos e dever do Estado, independentemente da renda per capita.

Ainda no que se refere à renda dos assistidos pelas entidades, há o artigo que diz que a gratuidade é oferecida a quem dela necessitar. Este item foi alterado pela nova minuta, que diz que a renda do assistido deve ser menor ou igual a meio salário mínimo.

Ação inviabilizada – Outro ponto negativo apontado pela Rebraf é o que inviabiliza a ação de algumas entidades assistenciais, como as religiosas. A lei atual diz que elas só não não consideradas beneficentes se atenderem somente a um público restrito. Para o representante da Rebraf, o novo decreto dá margem a uma interpretação errada de que estas entidades atendem apenas os seus fiéis, o que poderá dar argumentos ao governo federal para indeferir seu pedido de Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (Cebas).

No caso específico da concessão destes certificados, há outro ponto negativo na minuta do governo. Pela regra atual, o Cebas é concedido às entidades que o solicitam aos órgãos emissores. Pela nova lei, ele será dado às entidades reconhecidas pelo Gestor Municipal do Sistema Único de Assistência Social (Suas). Mas Leite lembra que este último ainda não está totalmente implantado e, quando for, a entidade correrá o risco de ficar submetida a injunções políticas do município para obter este reconhecimento.

Exigências injustas – Leite considera injustas, além de inconstitucionais, estas exigências, já que as entidades assistenciais e as organizações não governamentais (ONGs) estão cobrindo as necessidades das populações marginalizadas do País, das quais o Estado não dá conta de atender.

Outro ponto importante é que, atualmente, os analistas do CNAS são os encarregados habilitados a elaborar as análises e avaliações das entidades que desejam receber a certificação (Cebas). Pela nova lei, as solicitações passam a ser encaminhadas para a Receita Previdenciária. Para o diretor-secretário da Rebraf, esta última não é o órgão indicado para exercer esta função porque haveria conflito de interesses: à Receita interessa aumentar a arrecadação e não em conceder as isenções que as entidades filantrópicas solicitam.

Ele lembra que, atualmente, as entidades devem apresentar projetos em consonância com a política de assistência social já aprovada por seu estado ou município.

Recursos – Outro ponto polêmico que a minuta do governo pretende alterar é a possibilidade de o CNAS conceder a certificação da entidade em decisão única, ou seja, se ele não conceder o título, a entidade não pode se apresentar novamente e solicitá-la. "Isso fere o direito de ampla defesa, previsto na Constituição Brasileira e isso fará com que muitas entidades passem a atuar como ONGs comuns sem os direitos de isenção concedidos pelas leis de assistência social, como a isenção da quota patronal", diz Leite.

Ele reforça a necessidade de se divulgar a Moção de Respeito ao Terceiro Setor para se defender a ação das entidades assistenciais no País. "As novas propostas da minuta do decreto não podem justificar a ação de ferir a Carta Magna e a Lei Orgânica de Assistência Social (Loas)", conclui.

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