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A escola que dá uma lição de vida

Por Sandra Manfredini    28 de novembro de 2007
Quase todos os dias, David, de 6 anos, passa algumas horas na sala de aula. Ele faz desenhos, pinta, cria, brinca, se diverte no computador e dá os primeiros passos na leitura e na escrita. Nada fora do comum se o garoto não travasse, há dois meses, uma árdua luta contra a leucemia e se a sua escola não estivesse instalada na ala de pediatria, no quinto andar do Hospital A.C. Camargo, uma das referências nacionais para o tratamento de câncer.

Assim como seus pequenos pacientes, as 14 professoras (12 da Prefeitura e duas do Estado) da Escola Especializada Schwester Heine, se esforçam diariamente para evitar que os pacientes mirins em tratamento hospitalar percam o ano letivo. Elas acompanham o aprendizado das crianças e dos jovens, orientam nas tarefas e até aplicam provas, enviadas pelas escolas de origem. Mas, mais do que evitar a repetência, a escola tem o papel fundamental de proporcionar a socialização e também a elevação da auto-estima.

"O objetivo é trazer o convívio escolar, que faz muita falta às crianças, já afastadas do convívio social por causa da doença", disse Márcio Camargo, diretor de Ensino do hospital. Desde que foi fundada, há 20 anos, numa iniciativa de Carmem Prudente, a escola já atendeu 8,5 mil crianças. "Trabalhamos com uma média de 500 por ano", explicou Camargo. A Schwester Heine foi a primeira escola criada dentro de um hospital no País.

Momentos – Para as crianças, frequentar a colorida sala de aula é uma alegria dentro de um momento complicado, doloroso e difícil. "Fica mais fácil superar a doença. O meu filho fica mais contente", disse Delfina Norberta Magalhães, mãe de David. Sempre calado, o menino não desgruda os olhos da tela do computador onde brinca com jogos educativos. Ele fica internado de tempos em tempos para as sessões de quimioterapia.

Risonho, falante e "fazedor" de caretas, Arthur, de pouco mais de dois anos, nem reclama mais de ter de ir com frequência ao hospital. "Ele diz que vai para a escola", conta Eva, a avó. A mãe do menino, Carla, disse que ele quer ficar na sala de aula o tempo todo. "Ele nem quer tirar a agulha usada para a quimioterapia porque não quer voltar para casa", afirmou.

Luiz Durval Silva Queiroz, pai de Maria Alice, de 8 anos, é de Aracajú e está há quase um ano em São Paulo para acompanhar o tratamento da filha. "A escola dela, a Babylândia, manda o material via correio para que possa continuar aprendendo", disse. Para Luiz, a atividade é muito importante. "Além de não perder o ano, ela se distrai e se preocupa menos".

Ao contrário de Arthur, que fica triste ao ir embora, Elly, de 10 anos, não reclamou de voltar para casa. Já "de alta", ele terminava de preparar alguns enfeites de Natal que serão usados por seus colegas de hospital na festa comunitária. Elly é evangélico e não comemora a data. O garoto gosta da escola e se destaca pelos bonecos que faz. "Eu aprendo muito", disse.

"Já descobrimos muitos talentos aqui", afirmou a professora Eliane Latterza, há oito anos na Schwester Heine. Segundo ela, a escola ajuda, inclusive, a tratar a família, que acaba adoecendo junto com a criança. "O mais importante é manter a aderência ao tratamento. Ajudamos a criar na criança a perspectiva de ter uma vida melhor no futuro, de sonhar com o que vai ser quando crescer", explicou. A escola tem muitos ex-pacientes curados, adultos e graduados.

Formação – Com 20 nos de atuação, a escola Schwester Heine funciona atualmente em três ambientes no hospital – internação, brinquedoteca e no laboratório Lavoisier –, se tornou referência e passou a orientar a realização de projetos semelhantes em outras instituições de saúde dentro e fora do Estado de São Paulo. Agora passará também a investir na formação de profissionais.

Na semana passada realizou o curso Formação de Professores -Atendimento Pedagógico Hospitalar , com oito horas de aulas teóricas e quatro horas de visita monitorada. Para o próximo ano, o A. C. Camargo tem como objetivo a instalação de um curso de pós-graduação com o mesmo tema. "Queremos desenvolver especialistas em pedagogia hospitalar", finalizou Márcio Camargo.

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