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Centros socioeducativos são interditados por violação aos direitos dos adolescentes.

Por Rebrates   2 de junho de 2015

A Justiça do Estado do Ceará interditou, recentemente, três Centros Educacionais na capital, Fortaleza – Centro São Francisco, São Miguel e Centro Socioeducativo do Passaré. A decisão da juíza Mabel Viana Maciel, da 3ª Vara da Infância e Juventude, atende à Ação Civil Pública, ajuizada pelo Ministério Público do Estado, no dia 18 de março deste ano. De acordo com o texto da decisão, o Estado enfrenta "um caos no âmbito do Sistema Socioeducativo”. A determinação ordena que o número excedente de jovens seja transferido para imóveis alugados pelo Estado e que seja abolida, imediatamente, a medida disciplinar de isolamento conhecida como "tranca”.


A transferência dos adolescentes deve ocorrer no prazo de até 30 dias, a contar da data da notificação, não ultrapassando 90 jovens por casa. Está prevista uma multa de 10 mil reais por adolescente em situação irregular, a cada dia de descumprimento da decisão. A estruturação dos novos centros de internação provisória deve incluir também uma equipe técnica, composta de psicólogos, pedagogos e assistentes sociais, bem como de servidores, por meio de processo seletivo simplificado.

Em entrevista à Adital (Agência de Informação Frei Tito para América Latina), a promotora de Justiça da 7ª Promotori da Infância e Juventude, Antônia Lima Sousa, diz que o sistema socioeducativo vive uma "crise profunda”. "O Estado tem um plano, com ações e metas, mas falta adequar a realidade do sistema ao plano. A prática está aquém”, comenta. Para a promotora, experiências exitosas podem ser referência para mudanças. Ela cita os exemplos do Centro de Semiliberdade Mártir Francisca e o Centro Aldaci Barbosa, para adolescentes do sexo feminino, ambos em Fortaleza.

Em março deste ano, o Cedeca Ceará (Centro de Defesa da Criança e do Adolescente), a Anced (Associação Nacional dos Centros de Defesa de Crianças e Adolescentes) e o Fórum DCA (Fórum Permanente das ONGs de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente) apresentaram uma petição à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA).

O documento denuncia graves violações aos direitos de adolescentes privados de liberdade nas oito unidades socioeducativas de internação masculina no Estado do Ceará. As entidades solicitam o fim da tortura e demais violações institucionais, e pedem medidas para a proteção da vida e da integridade física dos adolescentes. A CDIH já notificou o Governo do Estado e o convocou a prestar esclarecimentos.

Também em entrevista à Adital, Natália Castilho, assessora jurídica do Cedeca/CE,comenta que o prazo previsto para resposta do Estado à CIDH venceu no último dia 08 de maio. Ela diz que não tem conhecimento se o Estado respondeu, mas avalia como positiva o interesse da CIDH. Segundo Natália, em até dois meses, a CIDH deve anunciar se aceita as medidas cautelares solicitadas na petição. A assessora destaca que o Estado precisa dar um "retorno eficaz” no combate às violações que vêm sendo cometidas.


Inspeção


Entre os principais problemas encontrados nos centros educacionais estão: superlotação, o uso da "tranca”, insalubridade, falta de segurança interna e externa das unidades, poucos socioeducadores e a ausência de atividades socioeducativas. De acordo com dados do Fórum DCA, as unidades interditadas enfrentam uma superlotação que supera 400% da capacidade, com motins diários e fugas constantes.

Segundo a inspeção da 7ª Promotoria às unidades de internação, em março deste ano, o Centro Educacional São Francisco abrigava 194 internos quando a capacidade é para 60; o Centro Passaré contava com 177 adolescentes, quando a capacidade é para 90; o Centro São Miguel acolhia 209 jovens para uma capacidade de 60. Em todos os três centros foi verificado um ambiente insalubre em toda a casa, dormitórios, banheiros e refeitório.

Em visita ao Centro São Miguel, no dia 26 março, uma comissão composta por várias entidades, entre elasa Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde Pública e a Vigilância Sanitária, constataramtambém graves violações. Encontraram adolescentes com hematomas supostamente causados por sessões de tortura, ferimentos por mordida de ratos devido às péssimas condições sanitárias dos dormitórios, marcas de sangue nas paredes; consultório odontológico com medicamentos vencidos; e seringas utilizadas guardadas em gavetas. O consultório foi interditado.

Números Brasil

Segundo o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) de 2013, existem 448 unidades socioeducativas no Brasil. Quanto à destinação por gênero, 77% (346) das instituições são exclusivamente masculinas, 54 exclusivamente femininas e 48 são instituições mistas. Do total de unidades, 263 (58,7%) têm destinação específica de faixa etária e 185 não têm faixa etária especificada. São Paulo concentra 136 unidades (30% do total nacional).

Em 2011, havia 19.595 adolescentes cumprindo medida em regime fechado e 88.022 em meio aberto (prestação de serviços à comunidade ou liberdade assistida). Em comparativo, os dados do Sinase indicam que aumentou a taxa de restrição e privação de liberdade: de 4,5%, em 2010, para 10,6%, em 2011. Também cresceram os atos infracionais relacionados ao tráfico de drogas (de 7,5%, em 2010, para 26,6%, em 2011). No entanto, houve redução de atos graves contra a pessoa de 2010 para 2011: homicídio (14,9% para 8,4%), latrocínio (5,5% para 1,9%), estupro (3,3% para 1,0%) e lesão corporal (2,2% para 1,3%).

Nas discussões sobre o sistema socioeducativo, as organizações sociais têm reivindicado a revisão da cultura institucional que, hoje, está baseada na violência e na restrição aos fundamentais dos adolescentes. Além disso, destacam a necessidade de uma ampla discussão sobre os planos pedagógicos desenvolvidos nos centros.

*Fonte: ABONG

http://www.abong.org.br/noticias.php?id=8771

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