Notícias

Novo secretário quer capacitação de ONGs

Por O Estado de São Paulo-HERTON ESCOBAR   28 de janeiro de 2002
Para José Goldemberg, questão ambiental tornou-se um tema complicado tecnicamente

O físico José Goldemberg assume a Secretaria de Estado do Meio Ambiente de São Paulo em um momento diícil. A sete meses da Rio + 10, conferência internacional que pretende discutir o futuro do meio ambiente no planeta, ele herda uma pasta recheada de poluição, desmatamentos, invasões e total descontentamento por parte das organizações não-governamentais (ONGs).

"É um grande desafio e olha que já ocupei outras posições desafiadoras", diz o professor, ex-reitor da Universidade de São Paulo, ex-ministro da Educação e ex-secretário do governo nas pastas de Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente. Especialista em energia, Goldemberg já deu aulas na Universidade de Toronto, Princeton e Stanford. Hoje integra o Conselho Nacional de Política Energética do governo federal. Ele assumiu o comando da secretaria no dia 22, em substituição ao deputado Ricardo Tripoli.

O professor viajou na semana passada para Nova York, onde coordenará, quarta-feira, uma reunião preparatória para a Rio + 10, com representates de entidades não-governamentais, da ONU e do Banco Mundial. O tema: energia e meio ambiente. "Acho que São Paulo tem um papel muito importante nessas questões pela sua contribuição ao efeito estufa", disse Goldemberg. "Algo que pretendo fazer imediatamente é constituir um grupo dentro da secretaria que se ocupe de mudanças climáticas - um item que não tem recebido muita ênfase no presente." Antes de viajar, Goldemberg detalhou seu planos em entrevista ao Estado.

Estado - Como o senhor pretende retomar o diálogo com as ONGs ambientalistas do Estado que romperam com a secretaria e abandonaram o Conselho Estadual do Meio Ambiente (Consema)?

Goldemberg - Já tive entrevistas com os dirigentes de várias organizações ambientalistas e pretendo organizar um calendário de reuniões para discutir os grandes problemas. Não se trata de um substituto para o Consema. São reuniões às quais pretendo dar um caráter técnico. Porque uma das coisas das quais me convenci é de que é preciso elevar o nível do debate.

Quero lançar um programa de capacitação das ONGs. Nas universidades existem cursos de graduação e pós-graduação na área ambiental e pretendo ampliar essas oportunidades. Ninguém precisa ser doutor para ser ambientalista, mas o tema ficou muito complicado tecnicamente.

Estado - Os ambientalistas têm muitas críticas, especialmente com relação às termoelétricas, um tema que o senhor conhece bem.

Goldemberg - Os grandes empreendedores desses projetos no passado não se preocupavam suficientemente com o meio ambiente, porque assim o projeto saía mais barato. Havia uma lógica empresarial. Com a resistência ambientalista, eles foram obrigados a aprimorar os mecanismos de controle e até mudar a tecnologia. Podemos forçar as empresas a usarem a tecnologia mais moderna que existe e polui menos. Isso claramente está ocorrendo.

Agora, é possível ter uma termoelétrica que não provoca poluição? Não. Assim como não é possível construir uma cidade sem destruir o meio ambiente pré-existente. É um debate contínuo e cada caso é um caso. Não há uma receita que sirva para todos.

Estado - Outro problema grave é a invasão de mananciais. Como o senhor pretende lidar com a situação?

Goldemberg - Uma lei está sendo preparada e deverá ser enviada para a Assembléia Legislativa para a proteção dos mananciais de São Paulo. Há 1,6 milhão de pessoas vivendo em áreas que, a rigor, deveriam ter sido protegidas há muito tempo. É completamente irrealista pensar que vamos tirar essas pessoas de lá. A Lei de Mananciais que está sendo preparada introduz uma idéia muito inteligente, muito criativa. Para regularizar uma construção em uma área ocupada irregularmente, o proprietário assume o compromisso de proteger outra área, ainda naquela mesma bacia. Isso garantiria uma proteção das áreas que ainda não foram ocupadas.

Estado - Ambientalistas reclamam que os parques estaduais estão abandonados.

Faltam vigias, veículos e infra-estrutura.

Goldemberg - Estou aqui há menos de uma semana e tenho ouvido esse tipo de relato. Algumas das nossas instalações, como o Instituto de Botânica e outros institutos, necessitam de uma melhoria de infra-estrutura. Isso é parte do problema. Agora, melhoria de infra-estrutura depende muito de recursos e algo que pretendo fazer é regulamentar a lei que reestruturou a secretaria, de 1997, para cobrar os licenciamentos.

Nós damos milhares de licenciamentos pequenos, e alguns grandes, e praticamente tudo isso é feito gratuitamente, o que eu considero errado. Em primeiro lugar, quem polui deve ser responsabilizado pela poluição, e não a sociedade em geral. Acho que o empreendedor que quiser construir uma fábrica deve pagar pelo licenciamento e, se efetivamente for poluidor, deve pagar compensações pela poluição que causa. Com isso espero que a gente consiga estabelecer uma agilidade maior na solução de problemas, porque uma queixa que existe é que os licenciamentos demoram muito e causam prejuízos. O que pretendo dizer aos industriais é que também quero que os licenciamentos sejam rápidos, mas isso tem um custo e eles terão de pagar por ele.

Estado - É possível conciliar desenvolvimento e conservação?

Goldemberg - Obviamente você quer os dois, mas não são sempre as mesmas pessoas que querem os dois. De modo geral, os ricos que já têm a maioria das amenidades que a sociedade promove têm um grande interesse em preservar o meio ambiente. Mas para os mais pobres, desenvolvimento é a grande prioridade. Você tem que conciliar esses problemas. Acredito firmemente que a tecnologia moderna permite soluções, mas não há absolutos. Não vai ser uma solução completa. As pessoas terão de aceitar soluções intermediárias.

Comentários dos Leitores