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Legislação como forma de incentivo ao desenvolvimento do Terceiro Setor

Por Revista Integração - Roberto Quiroga Mosquera - Flavia Regina de Souza   4 de fevereiro de 2002
No Brasil atual, temos algumas leis as quais poderíamos classificar como incentivadoras ao desenvolvimento do Terceiro Setor.

Sob esse enfoque, podemos citar a Lei Federal de Incentivo à Cultura, Lei nº 8.313/91, nacionalmente conhecida como Lei Rouanet. Utilizando-se da Lei Rouanet, as entidades podem captar recursos junto à iniciativa privada por meio de projetos culturais previamente aprovados pelo Ministério da Cultura. Esses projetos podem contemplar as mais diversas formas de expressão cultural, desde a construção de uma brinquedoteca e reforma de um auditório a uma exposição de arte barroca ou a realização de um evento relacionado ao folclore nacional.

No campo dos incentivos fiscais também podemos citar a Lei nº 9.249/95, que dispõe, entre outros, sobre o benefício da dedutibilidade das despesas com doações da base de cálculo do imposto de renda da pessoa jurídica tributada pelo lucro real. Esse benefício é concedido àquelas empresas que fizerem doações a entidades de educação, a instituições sem fins lucrativos portadoras do Título de Utilidade Pública Federal ou qualificadas como Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público.

Ainda na esfera dos incentivos fiscais, temos o incentivo às doações aos Fundos da Criança e do Adolescente. O Fundo, criado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, representa um recurso especial que busca viabilizar a execução das políticas públicas para o atendimento infanto-juvenil.

Vemos, nos exemplos acima citados, o Poder Público, por meio de legislação específica que estimula as doações, agindo em nome do desenvolvimento social.

Dentre as leis que incentivam o desenvolvimento do Terceiro Setor, podemos citar a Lei do voluntariado. Dada a importância do serviço voluntário e com o intuito de incentivar cada vez mais o cidadão a atuar na sua comunidade de maneira participativa, em 1998, o Congresso Nacional promulgou a Lei nº 9.608, que dispõe exclusivamente sobre esse serviço. Com a referida lei, o trabalho voluntário passou a ser juridicamente reconhecido. A Lei, ao definir o conceito legal de trabalho voluntário, sua natureza jurídica, os direitos e deveres do voluntário, delimitou as diretrizes dessa espécie de serviço. A partir da vigência da Lei do Voluntariado, as entidades e os voluntários passaram a conhecer, no campo jurídico, os limites da sua atuação. Se, para as entidades o trabalho voluntário não gera vínculo empregatício nem obrigações de natureza previdenciária, estas estão obrigadas a celebrar com o voluntário um Termo de Voluntariado, que deverá conter a descrição das atividades, o horário de trabalho, os direitos e deveres de cada uma das partes. Além disso, o termo de adesão constitui prova documental da não formalização do vínculo empregatício entre o voluntário e a organização.

Não podemos nos esquecer da grande novidade trazida pela Lei nº 9.790/99, mais conhecida como Lei das OSCIP - Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público, e por muitos denominada o Marco Legal do Terceiro Setor.

A Lei das OSCIP trouxe uma série de inovações extremamente relevantes para o Terceiro Setor brasileiro, em franco período de mudanças e evolução. Com os conceitos trazidos pela nova lei, o Terceiro Setor passa a ser visto como um novo setor na economia nacional.

A Lei das OSCIP surgiu para desburocratizar os processos de qualificação perante os órgãos públicos, simplificando os procedimentos para o reconhecimento institucional das entidades que pretenderem qualificar-se perante o Poder Público.

Com a edição dessa lei, o Poder Público delega ao particular, à sociedade civil organizada, uma série de atividades tidas como de interesse público. Para tanto, estabelece um regime jurídico diferente, inovador, pautado por princípios de direito público, como legalidade, moralidade, transparência e publicidade.

Sob o ponto de vista operacional, a Lei nº 9.790/99 criou o Termo de Parceria, novo instrumento jurídico a ser firmado entre Poder Público e entidades da sociedade civil qualificadas como OSCIP, que visa agilizar, controlar e favorecer a transparência nas relações com o Poder Público.

Além disso, a nova qualificação jurídica, ao contrário de toda regulamentação anterior, possibilita a remuneração dos dirigentes, exige a criação de um Conselho Fiscal como órgão de controle interno, bem como a publicação do relatório de atividades e das demonstrações financeiras. Tais medidas demonstram a preocupação com o profissionalismo e responsabilidade no Terceiro Setor gerando, em última instância, o aumento da credibilidade e da confiabilidade das organizações que o compõem.

Nos diversos casos citados acima, vimos como o direito posto, ou seja, a lei, pode atuar como estímulo ao desenvolvimento do Terceiro Setor.

Assim, muito embora ainda não exista um estatuto para regular de forma ampla o Terceiro Setor, pelos exemplos citados, podemos afirmar que, ao menos, parte da legislação atual incentiva o desenvolvimento do setor, que já se encontra em contínua expansão.

* Roberto Quiroga Mosquera é advogado, mestre em Direito Tributário pela PUC/SP e professor da FGV/EAESP e PUC/SP. Desde 1999, ministra as aulas de Aspectos Legais do Terceiro Setor no curso de "Administração para Organizações do Terceiro Setor" do GV/PEC. É coordenador e professor do curso de "Direito do Terceiro Setor" do GV/PEC.

** Flavia Regina de Souza é advogada do escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Junior e Quiroga Advogados. É coordenadora e professora do curso de "Direito do Terceiro Setor" do GV/PEC.

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