Notícias
A prefeitura de São Paulo agita mercado de imóveis
Se o mercado imobiliário costuma reclamar da falta de incentivos da Prefeitura ao setor, desta vez não pode se queixar do engajamento: a administração de Marta Suplicy resolveu entrar no negócio e virou ela própria imobiliária - só que agenciando moradores de rua e desabrigados.
A nova solução da Prefeitura para dar abrigo aos sem-teto - vista com olhos desconfiados por especialistas em habitação popular - foi colocada em prática com o Plano de Reabilitação Urbanística e de Atenção aos Moradores dos Vãos e Baixos de Viadutos e Pontes, iniciado no segundo semestre de 2001.
O programa levou 458 pessoas que moravam embaixo de viadutos para quartos de cinco hotéis no centros da cidade, com diárias de R$ 10 por pessoa - pagas pelo município -, e para casas alugadas a R$ 250 por mês.
Em fevereiro, o negócio foi expandido também para os desabrigados. A Prefeitura comprou pelo menos seis casas de moradores do Jaguaré, zona oeste, para abrigar famílias vítimas de um deslizamento de terra no Morro do Sabão. Segundo moradores, as casas custaram de R$ 5 mil a R$ 7 mil.
Na segunda-feira, a Sehab anunciou mais um progresso no ramo: as 41 famílias que foram desabrigadas pelo incêndio que atingiu no sábado a Favela Paraisópolis, zona sul, vão poder escolher entre voltar à antiga residência ou se mudar para casas alugadas por até R$ 300 - também pagos pelo município.
A Prefeitura garante que a incursão no mercado imobiliário vale a pena por causa do preço. A previsão é gastar R$ 3 mil anuais por cada família. "Como não temos hoje habitação para colocá-los, fica mais barato", diz Ivani Canossa, representante da Sehab no plano.
O investimento, porém, não vai beneficiar a todos. Por enquanto, vale para 1.200 moradores de viadutos da cidade e para os desabrigados em Paraisópolis e Jaguaré. As outros cerca de 10 mil pessoas que vivem hoje nas ruas da cidade - segundo estimativa da secretária de Assistência Social, Aldaíza Sposati - vão ter que continuar a disputar um das 4,8 mil vagas nos albergues da cidade.
E se o programa vai funcionar a longo prazo, ainda não há garantias. O prazo máximo para que os moradores pemaneçam nas moradias provisórias é de um ano.
Depois disso, a promessa é que recebam casas populares que poderão financiar a preços compatíveis com a renda. "O perigo é que os moradores passem a achar que têm direito à vaga no hotel para sempre e que quem está fora pense que também merece o benefício", diz o engenheiro Wander Ferraz, que prestou assessoria para a construção de casas populares na primeira gestão do ex-governador Mário Covas .
Para o engenheiro Alex Abiko, professor da Universidade de São Paulo especializado em habitações populares, o problema pode piorar se os ex-moradores de rua não forem encaminhados para empregos. Hoje, a maioria ainda trabalha como catador de sucata. "O papel da Prefeitura é reinserí-los na sociedade", diz. A Prefeitura promete enquadrá-los em programas de emprego a partir de abril.
A falta de dinheiro, para o advogado Márcio Bueno, especialista em direito imobiliário, pode levar os moradores a criar um mercado paralelo nas regiões. "Depois de um tempo, pode ser que acabem negociando os imóveis para terceiros, já que também não têm comprometimento com a região onde estão instalados".