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Sonho que se sonha junto

Por RITS - Rede de Informações para o Terceiro Setor    15 de abril de 2002
"Sonho que se sonha só é só um sonho, mas sonho que se sonha junto é realidade". A frase é de Raul Seixas, mas podia muito bem ter sido dita pela arquiteta Patrícia Chalaça, fundadora do Projeto Casa da Criança juntamente com o também arquiteto Marcelo Souza Leão, que reforma, sem precisar de dinheiro algum, creches, orfanatos e abrigos para crianças carentes em várias partes do país.

Desde seus tempos de faculdade, Chalaça tinha a idéia de construir uma creche em Recife, onde mora. Em meados de 1999, ouviu uma palestra de Viviane Senna na qual a diretora do Instituto Ayrton Senna (IAS) disse que qualquer um é capaz de realizar seus sonhos. Isso motivou a arquiteta a levar sua idéia adiante. Pouco tempo depois, visitou em sua cidade o abrigo estadual Casa de Carolina e ficou assustada com as condições do lugar. "As crianças tomavam banho de caneca com água vinda de um cano na parede e essas tinham várias infiltrações. Enfim, as condições eram totalmente indignas", lembra Patrícia. Reuniu então alguns colegas de profissão, que fizeram um projeto de reforma, apresentado ao governo do Estado, que prontamente autorizou as obras - afinal, não seria gasto um centavo dos cofres públicos.

A partir daí, os envolvidos começaram a bater na porta de diversas empresas de material de construção e empreiteiras. Para a surpresa geral, a recepção foi boa e quase todas aceitaram doar material ou ceder funcionários para tocar a obra. No total, participaram da empreitada 360 empresas, 27 construtoras e 64 pessoas, entre arquitetos, decoradores e artistas plásticos. Em 45 dias, as 100 crianças da Casa de Carolina viram uma mudança enorme no lugar onde viviam. As paredes estavam coloridas, o ambiente mais limpo, bonito e funcional. Tudo isso sem ninguém pôr dinheiro na reforma, que teria custado R$ 600 mil se todos tivessem cobrado seu preço usual. Assim nasceu o Casa da Criança.

Patrícia e Marcelo gostaram tanto do resultado que prometeram refazer pelo menos uma instituição de Recife por ano. O casal decidiu fazer ainda mais do que obras. Fundaram também a Companhia do Anjos, que leva novos programas de saúde, educação e lazer para os locais atendidos pelo projeto. "É uma chance de cada um colaborar com o que faz de melhor - independente da profissão - e melhorar ainda mais as condições das crianças", afirma Patrícia. Atraídos pela idéia, advogados se envolveram para redigir contratos com as empresas e instituições, designers para elaborar o logotipo do projeto e educadores para ensinar.

A notícia se espalhou e profissionais de outras cidades também quiseram fazer parte. O IAS foi procurado e decidiu apoiar os arquitetos. É o Instituto quem banca o deslocamento dos interessados para irem a Recife ou São Paulo receber ou dar treinamento. Além desses recursos, o único dinheiro movimentado pela organização é o proveniente da venda das 40 camisas que cada responsável por projeto recebe para vender (a R$ 10) - e pagar despesas fixas - e o valor do ingresso cobrado para a visitação das obras terminadas durante um certo período. Ainda assim, caso haja sobras, elas devem ir para as crianças. Para Patrícia, esse controle "é importante, pois o patrocinador quando entra na obra e vê tudo pronto, fica maravilhado. Aí já querem doar tudo de novo".

Oficialmente, Brasília foi a primeira cidade a receber o Casa da Criança. Em junho de 2000, a Casa do Candango, creche para 300 crianças, foi reinaugurada. Seis meses depois, mais uma instituição de Recife foi beneficiada. Com essas experiências, foi possível redigir um manual do projeto, denominado Franquia Social. Porém, para receber o manual, é necessário treinamento para o grupo de interessados (3 ou 4 profissionais, sendo 2 obrigatoriamente arquitetos). Todas as etapas são esclarecidas e só então é dada autorização para o uso do nome e do selo Casa da Criança. No primeiro ano, o franqueado ainda é chamado de trainee - por ainda estar sob observação - para só depois ser franqueado.

Em 2001, primeiro ano de franquia, cinco cidades foram pré-selecionadas, mas só três (Jundiaí, Maceió e Natal) a implantaram. Este ano serão atendidas sete unidades, sendo quatro em São Paulo e as outras em Goiânia, Fortaleza e Recife. Para 2003, estão sendo selecionadas instituições em Curitiba, Fortaleza, Natal, Maceió, Salvador e Recife. Como exigências para poderem ser atendidas, as organizações devem ser donas do imóvel e atender crianças de baixa renda.

Em pouco mais de dois anos de projeto, foram movimentados o equivalente a R$ 10,2 milhões por 467 pessoas, 328 construtoras e 3440 empresas. Tudo isso para beneficiar 1060 crianças, que viram o local em que vivem se transformar. Entretanto, a lição que fica é a de solidariedade. Provavelmente, se fosse pedido, esse dinheiro não seria doado, mas com cada um dando um pouco, é possível mobilizar cada vez mais pessoas para sonhar junto e transformar realidades.



Contato

O telefone (81) 3327-7963 e o endereço eletrônico projetocasadacrianca@ig.com.br estão disponíveis para quem quiser fazer parte do Projeto, tanto o levando para sua cidade quanto doando material ou trabalho.

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