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A História da Academia de Desenvolvimento Social

Por IntegrAção - http://integracao.fgvsp.br - Por Rui Mesquita*   2 de maio de 2002
Ingressei no curso de Administração da Universidade de Pernambuco1 no primeiro semestre de 1995, quando estava completando 18 anos de idade. Fazia pouco mais de um ano que havia me mudado de Fortaleza para o Recife. Minha aproximação com os movimentos sociais de juventude teve início nesse momento, quando logo na primeira semana de aula fui no DA-FCAP2 solicitar uma autorização para colocar um cartaz na faculdade, para encontrar alguém que tocasse bateria, pois estava querendo voltar a tocar em uma banda, como fazia na época em que ainda morava em Fortaleza.

Acabei não formando a banda mas fiz amizade com algumas pessoas que faziam parte do DA e fiquei sabendo que em junho daquele ano haveria um congresso da UNE3 na UnB4 , em Brasília. Um pouco depois disso, o DA iniciou uma campanha convocando os estudantes interessados da faculdade a se candidatarem a delegados para uma das quatro vagas a que tínhamos direito, para sermos representados lá em Brasília. Para minha surpresa, houve apenas um candidato, um estudante que na época cursava o 6º período. Diante disso, o DA apelou para os calouros para preencher as três vagas restantes. Acabei sendo escolhido, junto com outras duas pessoas da turma de calouros.

Foram 36 horas de estrada até Brasília. Durante a viagem, conversávamos muito sobre os temas do congresso, como mudar o Brasil e o mundo. O ônibus era todo de estudantes dos mais diversos cursos da UPE. Chegamos em Brasília e lá ficamos por cerca de dez dias. No decorrer do congresso, todo o sentimento de entusiasmo que eu tinha ao chegar à cidade começou a mudar. Comecei a perceber que apesar da grande maioria das dez mil pessoas participantes do congresso terem todo aquele discurso de um país e um mundo melhores, as relações pessoais entre elas eram, no mínimo, contrastantes com o discurso. Havia um sentimento muito forte de individualismo. Era muito claro que algumas pessoas estavam apenas tentando se sobressair. Vi que muitos lutavam mais pelo seu próprio ego e orgulho do que pelo sentimento de um mundo realmente melhor. Isso me surpreendeu, me assustou e me deixou um pouco triste também. Mas não fui o único que teve esse estranho sentimento.

Retornando ao Recife, no final de junho de 1995, uma outra surpresa: nos deparamos com o DA fechado. Percebemos então que deveriam ter acontecido eleições alguns meses antes e, aparentemente, nenhum dos mais de mil estudantes da faculdade de Administração havia sequer questionado ou colaborado com o DA para que elas ocorressem. O que está acontecendo? Por que essa apatia? Foi o tipo de pergunta que os quatro que acabavam de retornar de Brasília se faziam. Decidimos então que iríamos passar de sala em sala para convidar pessoas interessadas em, juntamente conosco, montar uma espécie de comissão eleitoral para organizar as eleições do DA. Conseguimos um grupo de cerca de sete pessoas. Convocamos, então, eleições para o DA, respaldados por um abaixo-assinado entre os alunos e, no início de 1996, as eleições ocorreram.

Durante o processo para as eleições, muita gente nos estimulou a criar uma chapa para concorrer. Assim, acabei sendo eleito presidente do DA-FCAP, assumindo a entidade, por um ano, em maio de 1996. Aceitamos o desafio por causa de todos esses sentimentos de frustração que tivemos tanto em Brasília, no Congresso da UNE de 1995, como na volta ao Recife com o DA fechado. Queríamos fazer diferente, mas não tínhamos a mínima idéia de como fazê-lo. Precisávamos de uma luz, de uma inspiração.

Ela veio por fax, pouco tempo após as eleições, convocando-nos a participar de uma reunião da Federação Nacional dos Estudantes de Administração - FENEAD5, que aconteceria na cidade de Salvador. Esta convocatória salientava que o DA-FCAP era representante desta Federação para os estados de Pernambuco e Alagoas. Inicialmente, ficamos surpresos e achando que seria uma espécie de repetição do que havíamos visto no ano anterior em Brasília. Mas, mesmo assim, decidimos ir a Salvador e saber o que era e o que fazia essa tal de FENEAD6.

Chegando em Salvador, tivemos uma surpresa muito boa. Descobrimos uma Federação criada há apenas um ano e que pregava e fazia um novo movimento estudantil, despartidarizado e preocupado não apenas com temas políticos, mas com temas sociais. Seu sonho era que todo o movimento estudantil se voltasse para a luta contra os problemas e as desigualdades sociais no Brasil. Nesta reunião, especificamente, estava em discussão a criação de um concurso nacional de projetos sociais, que mais tarde veio a se chamar Prêmio FENEAD .

Voltando de Salvador, decidimos que orientaríamos nossa gestão no DA-FCAP para a ação social, incentivando os estudantes a se aproximarem de ONGs e de projetos sociais. Com a afinidade com a FENEAD, também realizamos diversos trabalhos em conjunto, especialmente após havermos, oficialmente, através de eleição ocorrida durante o 22º ENEAD7, em julho de 1996, em Florianópolis, reafirmado a condição do DA-FCAP como representante da FENEAD nos estados de Pernambuco e Alagoas.

O trabalho continuou, com a criação do EREAD8 Nordeste. Com o sucesso do 1º EREAD Nordeste, muitas pessoas da FENEAD em todo o Brasil começaram acreditar que o Nordeste poderia também vir a ser sede nacional da FENEAD, uma vez que desde sua fundação, em 1995, sua Diretoria Nacional encontrava-se sediada na EAESP/FGV9. Nosso grupo do DA-FCAP candidatou-se à Diretoria Nacional da FENEAD. Fomos, então, eleitos e, pela primeira vez, a presidência saía da FGV em São Paulo para vir para a FCAP/UPE em Recife.

A partir de julho de 1998, quando faltava um ano para a conclusão do meu curso na FCAP/UPE, decidi que não iria mais participar de toda essa militância social e estudantil com a qual estive envolvido desde 1995, com o intuito de me dedicar a conclusão do curso em tempo hábil.

Desde o momento que conheci a FENEAD, havia decidido que iria concentrar meu curso em Administração de Organizações Sem Fins Lucrativos. Conversando com um amigo de faculdade, Romel Pinheiro, percebi que ele também estava com este mesmo sentimento de querer empreender na área social, uma vez que sua história acadêmica também o levou para este caminho. Juntos, decidimos que iríamos juntar esforços para criar algum tipo de projeto, no qual poderíamos nos dedicar e continuar nossa militância social, agora de forma mais profissional, após nossa formatura.

Nessa época, recebi um convite para participar de um curso de Formação de Técnicos em Políticas de Juventude, que aconteceu no Rio de Janeiro em novembro de 1998, promovido pela OBJ10 e pela Fundação Mudes. Durante as quase duas semanas que passei no Rio fazendo este curso, juntamente com pessoas de todo o Brasil, me veio em mente um audacioso projeto, muito estimulado por um dos cursos, o de Planejamento de Projetos Orientado por Objetivos (método ZOPP11 ). A idéia era a de uma incubadora de projetos sociais voltada para jovens como eu, como o Romel, que queriam empreender na área social, mas que se sentiam sem apoio ou orientação.

Voltando para o Recife, iniciei uma discussão com o Romel de como poderíamos criar uma organização que pudesse estimular o desenvolvimento da área social, do terceiro setor, através da participação de novos personagens, de jovens, como a gente. Foi aí que, após alguns meses de discussão, veio a idéia de criarmos uma ONG, a Academia de Desenvolvimento Social.

Hoje, o Instituto Academia de Desenvolvimento Social, chamado por nós de Academia, é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos e sem vínculos políticos, partidários ou religiosos, criada oficialmente em 1999 e com sede na cidade do Recife. Sua missão é o desenvolvimento social, através do fortalecimento institucional das organizações que compõem o terceiro setor e o desenvolvimento da juventude, estimulando e fortalecendo o empreendedorismo social jovem.

No seu plano estratégico a Academia define três áreas de atuação para seguir na busca da sua missão, que vêm sendo implementadas gradualmente desde 1999, com o amadurecimento e o fortalecimento da equipe: ÁREA DE INFORMAÇÃO: com o Núcleo de Informação e Comunicação; ÁREA DE FORMAÇÃO: com o Núcleo de Gestão Social; e ÁREA DE INTERVENÇÃO: com o Núcleo de Assessoria.

ÁREA DE INFORMAÇÃO

Com sua fundação em 1999, a Academia iniciou sua as atividades pondo em prática ações, projetos e produtos voltados inicialmente apenas para a área de informação, gerando conteúdo e disseminando informações na área social (especificamente gestão social) para manter atualizados profissionais atuantes no terceiro setor e jovens interessados em descobrir e discutir mais sobre temas e problemas sociais e comunitários. O Núcleo de Informação e Comunicação possui três grandes áreas:

Web site www.academiasocial.org.br: O nosso primeiro projeto, em meados de 1999, foi criar uma página na Internet que orientasse aqueles que desejam criar uma organização não-governamental e sem fins lucrativos para atuar na solução de problemas sociais, culturais ou ambientais, contendo uma série de informações e conteúdos sobre empreendedorismo social e também sobre aspectos legais, organizacionais e estratégicos.

Clipping Terceiro Setor: Ainda em 1999, iniciamos um grande projeto de disseminação de informações de notícias veiculadas nos mais variados periódicos e veículos de comunicação publicados na Internet. Surgiu então o Clipping Terceiro Setor, que em novembro de 2001 contava com aproximadamente 3.600 assinantes. Enviado gratuitamente por correio eletrônico, ele mantém todos os seus assinantes informados sobre o que é notícia on-line na área social.

Ciclo de Debates do Terceiro Setor: Iniciado no início de 2000 em Recife, é um ciclo periódico de debates sobre assuntos relacionados com o terceiro setor, com a finalidade de discutir temas como: captação de recursos, comunicação para o 3º setor, política pública etc.

A opção de iniciar o projeto nessas três áreas foi muito positiva, uma vez que para colocá-lo em prática dependíamos principalmente de nossa própria equipe, trabalho voluntário e algumas parcerias fundamentais, com universidades locais, para a realização dos ciclos de debates do terceiro setor. Mas vimos que não era suficiente apenas gerarmos conteúdo e criarmos meios para repassar informações e gerar discussão. Precisávamos ir adiante para conseguirmos alcançar na plenitude a nossa missão. Além de apenas INFORMAR, precisávamos também FORMAR jovens e pessoas ligadas ao terceiro setor, para uma atuação mais profissional. Começamos, então, a implementar nossa segunda área de atuação, a área de formação, com a criação do nosso Núcleo de Gestão Social.

ÁREA DE FORMAÇÃO

Durante o ano de 2000, formatamos alguns cursos de extensão com o objetivo de oferecer formação profissional em gestão. Ainda é carente no Brasil a disponibilidade regular de cursos sobre gestão no terceiro setor. A Academia lançou-se nesta empreitada e formatou uma série de cursos na cidade do Recife, formando mais de duas centenas de alunos entre os meses de novembro de 2000 e novembro de 2001, atuando, inclusive, em outras cidades (um curso em Petrolina/PE e dois no Rio de Janeiro/RJ).

Estes cursos de extensão (de 25 a 40 horas), com custo inferior aos normalmente praticados, vêm tornando a Academia de Desenvolvimento Social, uma organização jovem e formada por jovens, referência no Brasil em gestão social.

Mais uma vez, avaliando a prática do Núcleo de Gestão Social, percebemos que esses cursos vêm tendo grande demanda e significativo resultado positivo. Além disso, esses cursos contribuem para a auto-sustentabilidade da Academia. Os recursos obtidos servem não só para a manutenção das despesas deste projeto, mas também para o custeio de algumas bolsas concedidas a jovens impossibilitados de financiarem o curso e que estão empreendendo na área social.

A partir desse momento, além de INFORMAR, também estamos FORMANDO jovens e profissionais do terceiro setor, munindo-lhes de técnicas e métodos de gestão social, para ingressarem ou melhor desempenharem suas funções e projetos no campo do terceiro setor. Mas ainda assim precisamos continuar indo adiante para conseguirmos alcançar na plenitude a nossa missão.

No momento, estamos colocando em prática a nossa terceira área de atuação, planejada entre 1998 e 1999, durante o surgimento da Academia: a área de intervenção, com a criação do nosso Núcleo de Assessoria.

ÁREA DE INTERVENÇÃO

No final de 2001, planejamos o início da nossa terceira grande área estratégica de atuação, a área de intervenção, já com nossa equipe muito mais amadurecida e fortalecida pela experiência acumulada durante a implementação das primeiras duas áreas de atuação.

Para tal, voltamos à antiga idéia primária da incubadora de projetos sociais voltada para a juventude. Foi quando reformatamos o que, hoje, tornou-se o nosso maior e principal projeto: a Incubadora Social, materializando ações e metodologias concretas no nosso Núcleo de Assessoria.

Com esse núcleo, estamos avançando mais um degrau para o alcance dos nossos objetivos sociais, apoiando e orientando diretamente jovens e profissionais do terceiro setor para transformar idéias em ação, projetos em resultados. Além de INFORMAR e FORMAR, agora também vamos INCUBAR aqueles que realmente tenham o espírito de empreendedor social, que possam gerar novas tecnologias sociais, mudando a realidade dos problemas sociais e comunitários que enfrentem no seu contexto social.

Com o projeto da Incubadora Social, estamos criando uma oportunidade ímpar para estimular outros jovens como nós mesmos a também empreenderem socialmente e serem parte dessa crescente rede de jovens ativistas de todo o mundo.

Para começar a funcionar, a Incubadora Social está contando com uma parceria firmada com a Fundação W. K. Kellogg12, que acreditou na nossa ousadia e na nossa equipe e estará financiando os dois primeiros anos de implementação do projeto na cidade do Recife.

Tivemos que criar uma metodologia diferente, que não se restringisse aos modelos existentes de incubação de empresas de base tecnológica e de cooperativas. Criamos uma metodologia própria de incubação de projetos sociais, criada a partir de iniciativas de jovens da Região Metropolitana do Recife. Consideramos que o nosso processo de incubação consiste em oferecermos, por um ano, cinco serviços básicos para vinte jovens empreendedores sociais13 selecionados a cada ano. Os cinco serviços são: estrutura física de trabalho; capacitação de longo prazo; inserção dos jovens incubados nas redes locais da área social; consultor à disposição durante todo o período de incubação; e bolsa-auxílio para cobertura de pequenas despesas.

Hoje, a equipe da Academia cresceu. Não somos mais apenas eu e o Romel. Agora somos seis jovens empreendedores sociais, sonhadores e apostadores por um mundo melhor. Com esse texto gostaríamos expor um pouco mais da nossa experiência e dos nossos sonhos, que vêm sendo construídos desde 1995. Esperamos inspirar novos jovens empreendedores sociais com este depoimento, e ficaríamos extremamente contentes em poder conhecer cada um de vocês que se sentem, de alguma forma, inspirados por nossa experiência.

Há pessoas que vêem as coisas e perguntam: "- Por quê?". Outras, preferem sonhar com o mundo e perguntar: "- Por quê não?". Onde você se enquadra?

Saudações juvenis.

Contatos com a Academia de Desenvolvimento Social: www.academiasocial.org.br

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