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O novo tempo da responsabilidade

Por Jornal Valor - Oded Grajew   10 de julho de 2002
Temos que olhar para o horizonte mais distante

Apesar de junho ter começado num clima de fortes turbulências no câmbio e no mercado financeiro, mais de 650 empresários e executivos conseguiram desligar-se das preocupações mais imediatas e abrir espaço em suas agendas para debater e refletir sobre suas responsabilidades com o futuro de seus negócios e da sociedade.

A "Conferência Nacional 2002 - Empresas e Responsabilidade Social", realizada pelo Instituto Ethos, foi um marco importante que demonstrou a consolidação desse tema na agenda empresarial. É possível afirmar com convicção que estamos superando a fase de sensibilização. Hoje já há um entendimento de que a responsabilidade social é uma decisão estratégica que está diretamente relacionada à gestão do negócio e deve permear todas as práticas e os públicos com os quais a empresa se relaciona.

Não por acaso, o tema central desta quarta edição da Conferência foi "Gestão e Impacto Social", que permeou todas as atividades do evento, imprimindo a elas um forte caráter de formação. Ampliamos os espaços de discussão e aprofundamento em quatro painéis temáticos: "Gestão estratégica da responsabilidade social", "Diálogo com os atores sociais", "Impacto da ação social das empresas: aprendendo com experiências" e "Temas emergentes", por meio dos quais discutimos questões como integração da responsabilidade social no planejamento estratégico e sistemas de gestão, novos desafios para o meio ambiente, com influenciar políticas públicas, estratégias de parcerias com organizações da sociedade civil, avaliação do impacto de projetos sociais, responsabilidade social e a marca Brasil, economia sustentável na Amazônia, entre dezenas de outros assuntos de interesse.

Para discutir a responsabilidade social e a inserção competitiva das empresas brasileiras na economia global, convidamos para falar na plenária de abertura o empresário suíço Stephan Schmidheiny, presidente do GrupoNueva, formado por mais de 40 empresas situadas na América Latina, e presidente da Fundação Avina, que destacou: " o empresariado não pode prosperar numa sociedade fracassada " e propôs como solução um movimento que denominou de "solidariedade egoísta", desafiando as empresas a criarem oportunidades para inserir os mais pobres na sociedade de maneira benéfica para ambos. Propôs também a parceria das empresas com as ONGs para pressionar por políticas públicas de qualidade para todos, fundamentais na construção de uma sociedade justa e sustentável.

A responsabilidade social das empresas está cada vez mais inserida numa dimensão global. Para oferecer aos participantes a oportunidade de ouvir e debater como essa questão vem ocupando espaço no mundo, contamos com a presença de lideranças internacionais, como David Murphy, diretor de projeto da New Academy of Business, que juntamente com Anna Peliano, do Ipea, discutiu tendências e perspectivas do investimento social das empresas, e Adrian Hodges, diretor para as Américas do Prince of Wales Business Leader's Forum, que falou sobre práticas inovadoras da responsabilidade social.

Aproveitamos a conferência para apresentar os novos projetos do Institutos Ethos que visam ampliar e aprofundar essa discussão no País, dentro os quais destacamos a "1ª Mostra Ethos - Empresas e Responsabilidade Social", a ser realizada em 2003, (ação que tem por objetivo disseminar práticas empresariais socialmente responsáveis e divulgar experiências bem sucedidas que possam influenciar políticas públicas); a estruturação, em parceria com o Sebrae, de um programa que possibilite a implementação da responsabilidade social nas micro e pequena empresas; e "Prêmio Balanço Social - Abamec, Aberje, Ethos, Fides, Ibase", iniciativa que pretende contribuir para elevar o padrão de excelência na confecção e publicação dos balanços sociais das empresas e divulgar para a sociedade em geral a ação de responsabilidade social da iniciativa privada.

A Conferência é um o espaço em que o movimento da responsabilidade social mostra seu vigor, resultado de quatro anos de trabalho, repleto de ações, troca de experiências, questionamentos, confiança e entusiasmo. Nesse processo, muitos avanços foram alcançados. Contudo, enganam-se aqueles que pensam que as mudanças necessárias possam ser implementadas no curto prazo. Para transformar culturas e práticas arraigadas é necessário refletir e planejar numa perspectiva de médio e longo prazos. A esse respeito, menciono a resposta que o presidente do GrupoNueva deu a um jornalista brasileiro, quando perguntado sobre o impacto destas eleições e da sucessão presidencial nos rumos da economia brasileira. Stephan Schmidheiny falou que um de seus negócios é reflorestamento, no qual planta árvores que levam 25 anos até seu completo desenvolvimento. Segundo ele, quem faz investimentos nessa escala de tempo não pode se apegar ao que vai acontecer no curto prazo, com este ou aquele governo.

Da mesma maneira, quando pensamos no tempo para que a responsabilidade social empresarial se consolide no Brasil, temos que olhar também para o horizonte mais distante. Nessa perspectiva, o êxito da Conferência Nacional 2002, reconhecido amplamente por seus participantes, transforma-se em grande desafio e nos estimula a buscar novas conquistas e respostas, para desempenhar da melhor maneira possível o papel que a sociedade espera de todos nós, como empresários e cidadãos.



Oded Grajew é diretor-presidente do Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, presidente do Conselho Administrativo da Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança e do Adolescente e idealizador do Fórum Social Mundial

E-mail: ograjew@ethos.org.br

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