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Marketing com Responsabilidade

Por Informativo Ethos / Paulo Ricardo Meira e Renato Oliveira   6 de novembro de 2001
O Detran do Rio Grande do Sul oferece postos de trabalhos a apenados em processo de reinserção social. A Levi's norte-americana destina 250 mil dólares anuais a programas de controle da AIDS no Brasil. As Faculdades Ritter dos Reis promovem leitura de contos para detentas de penitenciária feminina e crianças socialmente excluídas. A Pirelli ensina famílias no Acre a melhor retirar a seiva das seringueiras e, assim, zela por sua preservação. O que motiva essas instituições, entre muitas outras, a saírem de seu foco e reservarem uma parte de suas energias para `fazer o bem`?

Enquanto as empresas ainda se preocupam em aderir aos programas de qualidade, na busca de certificações internacionais como a ISO 9000 e ISO 14000, a qualidade passa de uma vantagem competitiva sustentável para ser algo já esperado de um produto ou uma empresa. Diferenciais como a gestão ambiental (produzir sem agredir o ambiente) e, mais recentemente, a responsabilidade social tornam-se paulatinamente os verdadeiros diferenciadores no mercado. Trata-se de uma questão de crença, atitude, e mudança da postura em marketing. Se os consumidores desenvolvem a crença de que uma determinada empresa é socialmente responsável, desenvolvem uma atitude positiva para com ela e seus produtos. Essa postura é por vezes chamada de marketing societal (com preocupação social e ambiental), outras vezes de marketing de causa, ou simplesmente, marketing com responsabilidade social.

Conforme mostra uma matéria de Valdete Cecato na Gazeta Mercantil Latino-Americana no ano que passou, a responsabilidade social da empresa ofertante é um item cada vez mais importante nas decisões de compra dos consumidores. A primeira norma que surgiu com esse foco foi a SA 8000 (Social Accountability), criada em 1997 pelo The Council on Economic Priorities Accreditation Agency (CEPAA), visando assegurar que na cadeia produtiva de uma determinada empresa não ocorre trabalho forçado, discriminado ou infantil. Nas empresas com essa certificação, a remuneração é justa e há lazer, segurança e saúde para os empregados.

Mais nova ainda é a SA 1000, certificação lançada em novembro de 1999 pelo Institute of Social and Ethical Accountability, cujo foco é aferir as relações da empresa com a comunidade onde está inserida. Assim, para obterem esta certificação, as empresas devem manter programas de cunho social e assistencialista. Entre as empresas brasileiras com a certificação SA 8000 estão a De Nadai, Avon, Consultoria CESG e a Bahia Sul Celulose. De acordo com o consultor Stephen Kanitz, para causar o máximo de impacto entre a comunidade, com um mínimo de investimento necessário, é importante `abraçar uma única causa`, tornando-se conhecida por essa causa, como o fazem o Boticário (preservação da natureza) e a C&A (educação infantil).

Uma pesquisa do jornal Valor, em parceria com o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social aponta que 24% dos brasileiros já consomem levando em conta o posicionamento social da empresa, em comparação com o percentual de 46% dos consumidores norte-americanos. Segundo recente pesquisa na cidade de São Paulo, 64% das pessoas asseguraram que trocariam de produto se soubessem que a indústria é socialmente `mal comportada`. Empresas interessadas em saber como melhor explorar a questão do marketing social, como posicionamento estratégico, podem acessar um guia para tal no site www.filantropia.org. Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA com as maiores empresas do Sudeste do Brasil mostrou que 65% das multinacionais admitem sem rodeios que fazem ações sociais para melhorar a imagem da empresa, enquanto apenas 37% das empresas nacionais admitem o mesmo.

Como ilustração desse interesse, o Grupo Pão de Açúcar está investiu em 2000 US$ 8 milhões em ações sociais, culturais e esportivas e outros US$ 2,8 milhões em projetos educacionais que beneficiam filhos de funcionários e jovens de algumas comunidades nas quais o grupo possui lojas. Brilhante reportagem de Daniela Falcão na Folha de São Paulo do mês passado mostra que a Pirelli lançou seu pneu Xapuri, 100% feito com borracha extraída dos seringais da região de Xapuri, no Acre, área antes abandonada e com ameaça de sobrevivência dos seringueiros da região, que foram treinados a extrair borracha de forma qualificada e proteger com diversas técnicas a mata nativa. Igualmente, a Levi's utiliza açaí para tingir calças e camisetas e produz jeans com fios de garrafas PET. Incentiva seus funcionários a trabalhar como voluntários durante o expediente e destina 16 milhões de dólares por ano para ONGs de todo o planeta. O Brasil recebeu em 2000, da Levi's, 240 mil dólares para programas educativos contra a AIDS.

O exercício da Cidadania Empresarial pressupõe uma atuação eficaz da empresa em duas dimensões: a gestão da responsabilidade social interna e a mesma externa. A responsabilidade social interna focaliza o público interno da empresa, seus empregados e dependentes. O seu objetivo é motivá-los para um desempenho ótimo, criar um ambiente agradável de trabalho e contribuir para seu bem-estar. Com isso a empresa ganha a sua dedicação, empenho e lealdade. A responsabilidade social externa tem como foco a comunidade mais próxima da empresa ou o local onde ela está situada. Assim, quando uma empresa atua em ambas as dimensões adquire um status de empresa-cidadã.

Vê-se, assim, que, para vender bem, às vezes é necessário fazer o bem. Que tal seguir esses exemplos e vender mais?

*Paulo Ricardo Meira é Professor de Marketing da Ritter dos Reis e UCPel, Renato Oliveira é Consultor e Professor de Marketing da UCPel.

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