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O Estatuto da Criança e a imprensa
Por RITS - Rede de Informações para o Terceiro Setor    9 de novembro de 2001
O problema da criança e do adolescente é antigo no Brasil. Todas as grandes
cidades têm menores morando nas ruas, as rebeliões em abrigos são comuns e
muitas crianças passam fome. Essa situação tem pautado a mídia
freqüentemente, porém a cobertura dos acontecimentos vem sendo acompanhada
de erros tanto de apuração quanto de falta de informação sobre a condição
dos menores no país e sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor
desde 1990. Percebendo essas falhas, a jornalista e professora Ivanéa Maria
Pastorelli decidiu elaborar um "Manual de Mídia e Imprensa do Estatuto da
Criança e do Adolescente".
Segundo a autora, a publicação, que levou cerca de um ano para ficar pronta, pretende dar suporte a profissionais - não apenas jornalistas - dos meios de comunicação, para evitar erros de interpretação e fazê-los atentar para os pequenos aspectos da cobertura. O livro é organizado em temas como política de atendimento público, conceitos básicos, desvios mais comuns, sugestões de pauta e respostas a dúvidas mais freqüentes. Os erros, de acordo com a autora, são causados por diversos fatores, mas destaca-se a incompreensão da terminologia utilizada no Estatuto, pois ele é redigido em vocabulário jurídico. Um exemplo é a cobrança de ações do governo federal, quando, na verdade, o responsável pela tutela do menor de idade é o município, como afirmam tanto a Constituição quanto o Estatuto. O manual traz, portanto, uma interpretação simplificada das disposições, a fim de facilitar o trabalho dos jornalistas.
Outra falha comum é não ouvir os mais interessados no tema: as próprias crianças. "A criança é menosprezada nas coberturas. Ela só é ouvida em cadernos especiais voltados para esse público e em casos excepcionais, como rebeliões em casas de recuperação. O quadro fica ainda mais grave se ela não pertence à classe média", diz a autora. Ivanéa afirma que a criança mostra interesse em reportagens que falem sobre seu cotidiano e seus problemas, como demonstra pesquisa feita por ela e por uma turma de alunos da Universidade Santa Cecília, onde leciona.
Apesar dos erros, a mídia tem dado cada vez mais atenção às crianças e aos adolescentes. De acordo com levantamento da Agência Nacional dos Direitos da Infância (Andi), em 1997 foram publicadas 10 mil notícias sobre o tema em 50 veículos de comunicação - em sua maioria, relativas à área de educação. Em 2000, foram outras 76 mil, abordando mais temas. Outra prova do maior interesse da mídia é o Prêmio Ayrton Senna, que neste ano teve mais inscritos do que o Prêmio Esso de Jornalismo. "A qualidade, entretanto, não tem acompanhado o crescimento na mesma proporção", afirma Graziela Nunes, editora de pauta da Andi, "mas ainda assim há boas reportagens. Os jornalistas precisam ir mais a fundo, qualificar a matéria. Porém esses números não deixam de ser uma conquista". A fim de valorizar os profissionais que contribuem para a melhoria de vida das crianças, a Andi confere anualmente o diploma "Jornalista Amigo da Criança", que já conta com 202 profissionais em sua lista de agraciados.
Mário Volpi, do Unicef, concorda, mas vai além. Para ele, apesar de ainda não ser o ideal, houve melhoras significativas na imprensa nesses 11 anos de Estatuto, sendo a principal delas a mudança da visão dos jornalistas. "A criança deixou de ser vista apenas como vítima. Agora ela é considerada também um cidadão, com direitos e deveres. E o manual pode servir para intensificar esse ponto de vista, aumentando o entendimento da criança pelo que ela é e não pelo que não é", diz ele.
A qualidade das reportagens, segundo Pastorelli, não é restrita ao tema crianças e adolescentes. É um problema geral das redações, que estariam muito esvaziadas e com prazos cada vez menores. "Isso sobrecarrega os jornalistas, que não têm tempo para apurar a pauta corretamente, por terem muito trabalho. A apuração acaba sendo feita por telefone e fica deficiente", diz ela. Ainda assim, "a mídia tem uma responsabilidade social com a criança que não pode se restringir à publicação de suplementos", afirma.
As fontes também não são bem aproveitadas. Uma pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), em conjunto com a Andi, mostra que 80% dos trabalhos jornalísticos usam apenas dados do governo federal. Essa predominância leva a reportagens baseadas em releases, enquanto outras informações são desprezadas. A editora da Andi afirma que, para reverter a situação, as ONGs que trabalham com crianças e adolescentes precisam estar mais atuantes. "Todas elas deveriam contratar assessores de comunicação para divulgar suas ações e propor pautas", sugere.
As 10 mil cópias do Manual de Imprensa e Mídia do Estatuto da Criança e do Adolescente serão distribuídas a jornalistas, profissionais de publicidade, sindicatos e redações de todo o país. A autora afirma que não espera que a publicação cause uma revolução nas redações, mas ajude na elaboração dos trabalhos de mídia e chame atenção para o tema. "É uma semente que eu espero ver germinar", diz ela.
O Estatuto
Segundo Mário Volpi, do Unicef, os 11 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente apresentam aspectos positivos, negativos e alguns impasses. Houve melhorias quantitativas inegáveis. Hoje em dia, 97% das crianças estão matriculadas no Ensino Médio, houve diminuição da mortalidade infantil - apesar de o índice continuar alto -, o número de instituições, tanto governamentais quanto não-governamentais aumentou e o acesso a serviços básicos, como saúde e educação, melhorou bastante.
Por outro lado, qualitativamente, ainda há problemas. Praticamente todas as crianças em idade escolar estão matriculadas em alguma instituição de ensino, porém a evasão é grande. "Depois de dois ou três meses de aula, muitos alunos abandonam as salas, por diversos motivos", afirma o diretor do Unicef. A qualidade do ensino não é muito boa, pois o conteúdo ministrado nas escolas e creches é insuficiente. Isso faz com que os jovens tenham informação, mas não acompanhada de valores. Dessa forma, mesmo com a ampla divulgação de formas de prevenção da gravidez, o número de adolescentes grávidas não pára de crescer.
Os impasses são os temas ainda sem solução, como o trabalho infantil. Apesar das 500 mil crianças integradas ao projeto da bolsa-escola, esse número é pequeno se comparado aos dois milhões de menores que trabalham no país. Segundo Volpi, o problema persiste por falta de decisão política. Outro problema é a exploração sexual da criança, para o qual ainda não existe uma solução eficaz.
Segundo a autora, a publicação, que levou cerca de um ano para ficar pronta, pretende dar suporte a profissionais - não apenas jornalistas - dos meios de comunicação, para evitar erros de interpretação e fazê-los atentar para os pequenos aspectos da cobertura. O livro é organizado em temas como política de atendimento público, conceitos básicos, desvios mais comuns, sugestões de pauta e respostas a dúvidas mais freqüentes. Os erros, de acordo com a autora, são causados por diversos fatores, mas destaca-se a incompreensão da terminologia utilizada no Estatuto, pois ele é redigido em vocabulário jurídico. Um exemplo é a cobrança de ações do governo federal, quando, na verdade, o responsável pela tutela do menor de idade é o município, como afirmam tanto a Constituição quanto o Estatuto. O manual traz, portanto, uma interpretação simplificada das disposições, a fim de facilitar o trabalho dos jornalistas.
Outra falha comum é não ouvir os mais interessados no tema: as próprias crianças. "A criança é menosprezada nas coberturas. Ela só é ouvida em cadernos especiais voltados para esse público e em casos excepcionais, como rebeliões em casas de recuperação. O quadro fica ainda mais grave se ela não pertence à classe média", diz a autora. Ivanéa afirma que a criança mostra interesse em reportagens que falem sobre seu cotidiano e seus problemas, como demonstra pesquisa feita por ela e por uma turma de alunos da Universidade Santa Cecília, onde leciona.
Apesar dos erros, a mídia tem dado cada vez mais atenção às crianças e aos adolescentes. De acordo com levantamento da Agência Nacional dos Direitos da Infância (Andi), em 1997 foram publicadas 10 mil notícias sobre o tema em 50 veículos de comunicação - em sua maioria, relativas à área de educação. Em 2000, foram outras 76 mil, abordando mais temas. Outra prova do maior interesse da mídia é o Prêmio Ayrton Senna, que neste ano teve mais inscritos do que o Prêmio Esso de Jornalismo. "A qualidade, entretanto, não tem acompanhado o crescimento na mesma proporção", afirma Graziela Nunes, editora de pauta da Andi, "mas ainda assim há boas reportagens. Os jornalistas precisam ir mais a fundo, qualificar a matéria. Porém esses números não deixam de ser uma conquista". A fim de valorizar os profissionais que contribuem para a melhoria de vida das crianças, a Andi confere anualmente o diploma "Jornalista Amigo da Criança", que já conta com 202 profissionais em sua lista de agraciados.
Mário Volpi, do Unicef, concorda, mas vai além. Para ele, apesar de ainda não ser o ideal, houve melhoras significativas na imprensa nesses 11 anos de Estatuto, sendo a principal delas a mudança da visão dos jornalistas. "A criança deixou de ser vista apenas como vítima. Agora ela é considerada também um cidadão, com direitos e deveres. E o manual pode servir para intensificar esse ponto de vista, aumentando o entendimento da criança pelo que ela é e não pelo que não é", diz ele.
A qualidade das reportagens, segundo Pastorelli, não é restrita ao tema crianças e adolescentes. É um problema geral das redações, que estariam muito esvaziadas e com prazos cada vez menores. "Isso sobrecarrega os jornalistas, que não têm tempo para apurar a pauta corretamente, por terem muito trabalho. A apuração acaba sendo feita por telefone e fica deficiente", diz ela. Ainda assim, "a mídia tem uma responsabilidade social com a criança que não pode se restringir à publicação de suplementos", afirma.
As fontes também não são bem aproveitadas. Uma pesquisa da Universidade de Brasília (UnB), em conjunto com a Andi, mostra que 80% dos trabalhos jornalísticos usam apenas dados do governo federal. Essa predominância leva a reportagens baseadas em releases, enquanto outras informações são desprezadas. A editora da Andi afirma que, para reverter a situação, as ONGs que trabalham com crianças e adolescentes precisam estar mais atuantes. "Todas elas deveriam contratar assessores de comunicação para divulgar suas ações e propor pautas", sugere.
As 10 mil cópias do Manual de Imprensa e Mídia do Estatuto da Criança e do Adolescente serão distribuídas a jornalistas, profissionais de publicidade, sindicatos e redações de todo o país. A autora afirma que não espera que a publicação cause uma revolução nas redações, mas ajude na elaboração dos trabalhos de mídia e chame atenção para o tema. "É uma semente que eu espero ver germinar", diz ela.
O Estatuto
Segundo Mário Volpi, do Unicef, os 11 anos de Estatuto da Criança e do Adolescente apresentam aspectos positivos, negativos e alguns impasses. Houve melhorias quantitativas inegáveis. Hoje em dia, 97% das crianças estão matriculadas no Ensino Médio, houve diminuição da mortalidade infantil - apesar de o índice continuar alto -, o número de instituições, tanto governamentais quanto não-governamentais aumentou e o acesso a serviços básicos, como saúde e educação, melhorou bastante.
Por outro lado, qualitativamente, ainda há problemas. Praticamente todas as crianças em idade escolar estão matriculadas em alguma instituição de ensino, porém a evasão é grande. "Depois de dois ou três meses de aula, muitos alunos abandonam as salas, por diversos motivos", afirma o diretor do Unicef. A qualidade do ensino não é muito boa, pois o conteúdo ministrado nas escolas e creches é insuficiente. Isso faz com que os jovens tenham informação, mas não acompanhada de valores. Dessa forma, mesmo com a ampla divulgação de formas de prevenção da gravidez, o número de adolescentes grávidas não pára de crescer.
Os impasses são os temas ainda sem solução, como o trabalho infantil. Apesar das 500 mil crianças integradas ao projeto da bolsa-escola, esse número é pequeno se comparado aos dois milhões de menores que trabalham no país. Segundo Volpi, o problema persiste por falta de decisão política. Outro problema é a exploração sexual da criança, para o qual ainda não existe uma solução eficaz.