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Uberlândia, um exemplo de inclusão a ser seguido
No Brasil ainda não existe um município plenamente acessível à pessoa com deficiência, mas alguns avanços notáveis foram conquistados nos últimos anos, a exemplo dos encontrados em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, considerada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como uma cidade modelo em acessibilidade.
Por lá a frota de ônibus é totalmente adaptada – foi o primeiro município do país a conseguir fazer essa adequação. Escolas, hospitais e locais de atendimento à população estão recebendo rampas de acesso, pisos táteis e, gradualmente, têm incorporado a seus quadros de funcionários profissionais treinados para atender quem possui necessidades especiais.
As melhorias, que renderam reconhecimento internacional à cidade, só foram concretizadas porque o poder público se mostrou sensível à realidade de 24% da população local. Cerca de 135 mil moradores de Uberlândia têm algum tipo de deficiência, segundo dados oficiais de 2013.
Diante desse quadro, toda obra pública licitada no município mineiro passou a levar em consideração a questão da acessibilidade, diz Cláudia Coutinho, superintendente da pessoa com deficiência e mobilidade urbana de Uberlândia. “É a atitude das pessoas que precisa mudar. O que fazemos por aqui é simplesmente seguir o que está previsto na Lei Brasileira de Inclusão”, diz Cláudia.
Ela enfatiza que a mudança de postura não pode ser esperada apenas daqueles que governam as cidades, mas de toda a sua população. O empresário que abre uma loja, por exemplo, precisa pensar que parte da sua clientela chegará em cadeira de rodas, ou terá dificuldades para enxergar os preços nas etiquetas, enfim, precisará de alguma atenção especial.
O que acontece em Uberlândia é resultado de um processo iniciado há cerca de dez anos. Hoje, mais do que a infraestrutura da cidade, o que se busca mudar é a percepção das pessoas para a realidade de quem possui algum tipo de deficiência.
Cláudia diz que no município existe um programa de treinamento para arquitetos, engenheiros, além de bancários, recepcionistas e outras pessoas que atendem diretamente o público. Esses profissionais são induzidos a vivenciar experiências cotidianas de quem possui alguma necessidade especial. “Nós vendamos essas pessoas, colocamos em cadeiras de rodas, para que entendam as dificuldades de quem está do outro lado”, diz a superintendente.
Uberlândia possui 25 instituições voltadas às pessoas com deficiências. As escolas, aos poucos, recebem infraestruturas e recursos tecnológicos para atender esse público. Segundo Cláudia, das 117 escolas da rede municipal, 106 estão preparadas para atender cerca de três mil alunos com necessidades especiais que vivem no município.
“Quando os projetos são tirados do papel, uma ideia acaba puxando outra. Muitas iniciativas voltadas à acessibilidade são apresentadas pelas próprias pessoas com deficiência”, diz a superintendente.
É o caso da central de interpretação de Libras, que busca facilitar o acesso de pessoas com limitações auditivas a serviços públicos por meio da tradução e interpretação da Língua Brasileira de Sinais (Libras). As centrais contam com intérpretes em hospitais, delegacias, tribunais de Justiça, entre outros locais de atendimento ao público.
“A ideia é trabalhar para que Uberlândia seja 100% acessível”, afirma Cláudia. Apesar dos avanços sem igual no País, muito ainda precisa ser feito para que o objetivo da superintendente seja alcançado.
A verdade é que a adaptação dos equipamentos urbanos precisa sempre acompanhar o avanço das tecnologias voltadas à pessoa com deficiência. Pegando o exemplo da frota de ônibus da cidade mineira, de fato ela é completamente adaptada, considerada pela Comissão de Transportes da Câmara dos Deputados como uma das melhores malhas de transporte da América do Sul, ao lado da de Bogotá (Colômbia), e Curitiba.
Porém, a solução encontrada nos ônibus de Uberlândia, os elevadores hidráulicos para auxiliar quem tem dificuldade de locomoção, já não é considerada a melhor. Hoje em dia, a reivindicação de quem usa cadeira de rodas são ônibus com piso baixo, muito mais práticos.
É um trabalho de ajustes constante, diz Cláudia, que só funciona quando existe integração entre os diferentes órgãos públicos. “Meu trabalho na superintendência da pessoa com deficiência é integrar as demais secretarias. Eu não faço política pública, mas estimulo as demais secretarias a fazer”, diz a superintendente.
São as secretarias de transporte, da educação, da saúde, de obras que vão colocar em prática os projetos elaborados no âmbito da secretaria da pessoa com deficiência. Essa integração deve envolver, inclusive, as esferas estadual e federal.
Só assim foi possível que quase 600 apartamentos do programa federal Minha Casa Minha Vida fossem entregues na cidade mineira já adaptados para quem possui necessidades especiais.
Mas é evidente que essa preocupação ainda não está incutida entre as prioridades da maioria dos governantes e da população. São poucas as cidades nas quais se pode destacar iniciativas voltadas para melhorar a acessibilidade. “Em algumas capitais não existe nem mesmo uma secretaria da pessoa com deficiência”, lamenta Cláudia.
Somos um país de jovens, que só agora começa a se preocupar com a questão do envelhecimento da população. Talvez com o crescimento do número de idosos a questão da acessibilidade ganhe mais destaque. Vale lembrar que tornar uma cidade acessível não se limita a atender às necessidades de cadeirantes ou deficientes visuais, mas também de idosos, obesos e crianças.
As deficiências das cidades não podem segregar essas pessoas.