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A luta pelos direitos dos trabalhadores rurais
Por RITS    18 de dezembro de 2001
A defesa dos direitos dos trabalhadores rurais do Paraná possibilitou ao
advogado Darci Frigo, da Comissão Pastoral da Terra do Paraná, receber o
prêmio Robert F. Kennedy, entregue a defensores dos direitos humanos no
mundo. Crítico do “maior processo de reforma agrária da história brasileira”
, Frigo diz que a situação dos trabalhadores em todo o Brasil é muito
precária. “Há muitos assasinatos e impunidade”, diz ele. Nesta medida, pede
um poder judicário menos viciado e subsídios para a agricultura familiar. Em
entrevista à Rets, ele comenta os problemas da Justiça brasileira e da
conquista da cidadania dos trabalhadores rurais, além de fazer uma análise
do programa de reforma agrária brasileiro.
Rets - Qual a situação da reforma agrária no Brasil? Darci Frigo - A reforma agrária que vem sendo feita no governo Fernando Henrique é insuficiente e muito lenta. Os assentamentos que foram feitos não conseguiram dar conta nem do exôdo rural. Uma prova disso é que houve de 300 mil a 400 mil assentamentos ao longo de 94 e 98, enquanto o exôdo foi de 920 mil popriedades rurais com menos de 100 hectares de 1985 a 96, segundo dados do censo divulgado em 96.
Outro problema é que a reforma agrária tem sido golpeada pelos modelos político e agrícola atuais. Esses modelos privilegiam a grande agricultura e deixam de lado a familiar. O Mercosul, por exemplo, afetou toda a agricultura nacional, principalmente a familiar do sul do país, uma vez que os pequenos agricultores não tinham como concorrer com grandes produtores da Argentina e do Uruguai. E essa política resultou na divisão dos ministérios ligados à questão agrária. Há hoje o Ministério da Agricultura, que cuida dos interesses dos grandes proprietários e da política agrícola, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, responsável pelos pequenos agricultores. Ou seja, há o ministério dos ricos e o dos pobres e em nenhum deles se discute uma política central para a agricultura familiar, que possui caráter mais social e é voltada para o mercado interno.
Rets - Como está a situação dos direitos dos trabalhadores rurais no Brasil?
Frigo - A situação dos trabalhadores rurais é a mais grave entre todos os trabalhadores, embora algumas situações típicas do campo, como a superexploração, com jornadas de trabalho absurdas, estejam ficando comuns também na cidade. A situação na agricultura está cada vez mais precarizada, pois os direitos mínimos da cidade geralmente são os direitos máximos dos trabalhadores rurais. Um exemplo disso é o salário mínimo: são raros os que o recebem no campo, mais ainda os que recebem mais além disso. Isso quando são assalariados.
Outro problema enfrentado é a sazonalidade de algumas culturas. Um bom exemplo são os cortadores de cana de todo o Brasil. Eles têm seis meses de trabalho e depois são dispensados. Se não encontram outro trabalho na safra do café, por exemplo, ficam sem recurso algum para se sustentar. Não tendo trabalho e sujeitos a superexploração, são facilmente submetidos ao trabalho escravo, que é o último elo da cadeia de degradação das relações trabalhistas no campo. Essas pessoas são presas fáceis para aliciadores que fazem ótimas promessas e os levam a fazendas onde irão trabalhar sem receber nada. Em 2000, foram libertados 465 trabalhadores nessas condições e neste ano já foram 1812.
O governo fica numa posição ambígua. Por um lado o Ministério do Trabalho promove campanhas contra a escravidão e por outro há cortes de verbas das mesmas. Há ainda muita pressão por parte dos latifundiários e isso faz com que a fiscalização seja menos eficiente.
Rets - O que falta para os trabalhadores rurais serem vistos como cidadãos?
Frigo - Primeiramente é preciso dizer que a pirâmide populacional se inverteu nas últimas décadas. Hoje temos 80% da população vivendo nas cidades, e isso dificulta a visibilidade do movimento. Portanto foi no início da década de 60, quando a relação ainda era inversa, que se conquistou o Estatuto do Trabalhador Rural, que garantiu direitos mínimos aos camponeses. É importante resaltar que nas décadas de 80 e 90 os trabalhadores rurais emergiram como atores políticos, que é a saída para melhorar sua situação, cobrando do governo e da sociedade medidas como a reforma agrária, um resgate histórico da cidadania.
Logo, deve-se acelerar o processo de reforma agrária no país, assim como investir em áreas sociais. Não há motivos para manter a prioridade de recursos em bancos, na economia de exportação e em grandes indústrias. Tem de haver uma política de incentivo à agricultura familiar, que dá trabalho e alimento.
Outro ponto importante é a questão dos direitos humanos. Existe muita violência e impunidade. Só neste ano foram assasinados 25 trabalhadores rurais. Os proprietários de terra têm que parar de se ver como donos não só da terra, mas também da justiça e da vida de outras pessoas.
Rets - Quais são as principais formas de organização de trabalhadores rurais no Brasil? Qual é a sua avaliação delas?
Frigo - O fato de existirem vários movimentos é central para atender à demanda. O lado negativo do movimento fica por conta de sindicatos cartoriais com filosofia assistencialista e que servem como entrave ao reconhecimento de direitos. Afinal, este é um movimento que nasceu no processo da ditadura militar.
O lado positivo é ver os trabalhadores como atores. Até cinco anos atrás, não haveria diferenças entre as partes boas e ruins da organização rural. Hoje esse ator tem visibilidade por meio de movimentos de luta pela reforma agrária como o MST e o próprio movimento sindical. É preciso criar e recriar o espaço de reconhecimento de suas causas, como foi feito com as marchas e visitas a escolas e universidades. Estas, inclusive, recolocaram o tema em suas agendas.
Só que há problemas com a grande mídia, que parece ter um pacto de silêncio para não divulgar ações de movimentos rurais. Quando eles aparecem, é na linha de criminalização.
Rets - Além da mídia, quais são os maiores problemas que essas organizações enfrentam?
Frigo - Um problema é a força da bancada ruralista, que impede o avanço de projetos no Legislativo, como o limite de propriedade rural e a mudança da jurisdição estadual para a federal de casos envolvendo direitos humanos. A representatividade deles na sociedade não é grande, mas no Congresso, sim. O novo Estatuto da Terra está tramitando por iniciativa deles. Se houer mudanças na CLT, os que mais perdem, com certeza, são os trabalhadores do campo, cuja situação será ainda mais precarizada.
Outra dificuldade é conseguir recursos, que atingem uma pequena parcela, quase insignificante. Os pequenos agricultores são maioria, mas apenas alguns têm acesso a esses créditos, por causa da burocracia. Além disso, é um recurso caro, que deveria ser subsidiado. Não há motivos para vermos subsídios como “crime”. Os norte-americanos gastaram US$ 32 bilhões em 2000, enquanto aqui não há nenhum. Lutar na OMC contra esses subsídios não resolve, pois eles são destinados a grandes agricultores, que concorrem entre si. Aqui o modelo tem que ser outro. É mais barato manter uma família no campo do que na cidade. Os recursos estão diminuindo, é preciso ampliá-los.
Rets - Qual é a sua avaliação da Justiça brasileira na questão rural?
Frigo - Grande parcela tem visão patrimonialista e individualista, um olhar acima dos valores da Constituição. O judiciário continua julgando demandas rurais como individuais. A esperança é que alguns juízes tenham visão social, como aconteceu em Santa Maria (RS). Lá o responsável pela ação contra uma ocupação pediu provas da função social da propriedade, e não atestados de posse. A função social não foi provada e o tribunal confirmou a decisão de desapropriar a terra. Isso é uma novidade e mostra como esse olhar só começou a ser acolhido agora. O Ministério Público foi instituído como guardião da sociedade, ele tem que cobrar ações e fiscalizar. Essas são funções novas, o que é um avanço.
As polícias obedecem a oligarquias e parlamentares “leiloam” delegacias. Os inquéritos, assim, já chegam viciados ao Judiciário. Este acaba não fazendo seu papel de ver a sociedade como ela é. Outra deficiência é a existência de tribunais militares, que raramente condenam.
Rets - O senhor participa da Rede Nacional Autônoma de Advogados Populares. Como ela surgiu e funciona?
Frigo - A rede nasceu há seis anos, como uma articulação informal de advogados que prestavam serviços a organizações como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento de Atingidos por Barragens. Já havia outras articulações, mas geralmente eram estaduais. Com o crescimento dos movimentos sociais, veio a possibilidade de estender o trabalho a outras regiões, e assim a rede se tornou nacional. A partir das demandas dos movimentos sociais é que realizamos as ações. Os encontros dos movimentos servem como espaço de capacitação e elaboração de estratégias jurídicas. Hoje há cerca de cem advogados trabalhando diretamente com eles e 500 pessoas envolvidas no projeto, que dão sua colaboração sempre que possível.
Rets - Qual tem sido o papel da CPT na organização dos trabalhadores rurais no Brasil?
Frigo - Nós procuramos ser sensíveis aos problemas dos trabalhadores e dar assessoria e apoio a eles para que superem suas dificuldades se organizando. A pressão feita no poder público conta com nosso apoio. A CPT “empresta” sua voz quando necessário, mas quer mesmo que a voz seja deles próprios. Não queremos constituir organizações nossas, mas servir de “sal e fermento” para eles formarem seus organismos. Queremos também que as igrejas se comprometam mais com os direitos dos trabalhadores. Quando fui receber o prêmio, tive uma audiência no BID e mostrei a importância do reconhecimento dos trabalhadores como pessoas com direito de serem assentadas e de se tornarem proprietárias. No Paraná, apoiamos essa bandeira. No governo Lerner, de 97 a 2001, a violação dos diretos humanos se agravou. Foram feitas 500 prisões de trabalhadores rurais, principalmente lideranças. O número é sem precedentes no país e ainda há casos de tortura, 16 assassinatos e despejos.
Rets - Em que medida o prêmio Kennedy ajuda na construção da cidadania dos agricultores e na divulgação dos movimento sociais brasileiros?
Frigo - O prêmio é o reconhecimento da causa dos camponeses, mesmo que tenha sido entregue a uma pessoa. Parece que somos fracos, mas justamente por evidenciarmos nossos problemas é que fomos reconhecidos. O prêmio permite ainda que a sociedade norte-americana nos dê mais atenção. Há pessoas por lá que estão bastante preocupadas com os direitos civis, econômicos e sociais de outras partes do mundo.
Nós temos que apoiar a causa, que depende de políticas públicas para serem solucionadas. Não basta ter proteção, o estado tem que efetivar os direitos garantidos. Nessa medida, o prêmio reforça a luta e garante a permanência da causa e dá a ela maior visibilidade.
Rets - Qual a situação da reforma agrária no Brasil? Darci Frigo - A reforma agrária que vem sendo feita no governo Fernando Henrique é insuficiente e muito lenta. Os assentamentos que foram feitos não conseguiram dar conta nem do exôdo rural. Uma prova disso é que houve de 300 mil a 400 mil assentamentos ao longo de 94 e 98, enquanto o exôdo foi de 920 mil popriedades rurais com menos de 100 hectares de 1985 a 96, segundo dados do censo divulgado em 96.
Outro problema é que a reforma agrária tem sido golpeada pelos modelos político e agrícola atuais. Esses modelos privilegiam a grande agricultura e deixam de lado a familiar. O Mercosul, por exemplo, afetou toda a agricultura nacional, principalmente a familiar do sul do país, uma vez que os pequenos agricultores não tinham como concorrer com grandes produtores da Argentina e do Uruguai. E essa política resultou na divisão dos ministérios ligados à questão agrária. Há hoje o Ministério da Agricultura, que cuida dos interesses dos grandes proprietários e da política agrícola, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, responsável pelos pequenos agricultores. Ou seja, há o ministério dos ricos e o dos pobres e em nenhum deles se discute uma política central para a agricultura familiar, que possui caráter mais social e é voltada para o mercado interno.
Rets - Como está a situação dos direitos dos trabalhadores rurais no Brasil?
Frigo - A situação dos trabalhadores rurais é a mais grave entre todos os trabalhadores, embora algumas situações típicas do campo, como a superexploração, com jornadas de trabalho absurdas, estejam ficando comuns também na cidade. A situação na agricultura está cada vez mais precarizada, pois os direitos mínimos da cidade geralmente são os direitos máximos dos trabalhadores rurais. Um exemplo disso é o salário mínimo: são raros os que o recebem no campo, mais ainda os que recebem mais além disso. Isso quando são assalariados.
Outro problema enfrentado é a sazonalidade de algumas culturas. Um bom exemplo são os cortadores de cana de todo o Brasil. Eles têm seis meses de trabalho e depois são dispensados. Se não encontram outro trabalho na safra do café, por exemplo, ficam sem recurso algum para se sustentar. Não tendo trabalho e sujeitos a superexploração, são facilmente submetidos ao trabalho escravo, que é o último elo da cadeia de degradação das relações trabalhistas no campo. Essas pessoas são presas fáceis para aliciadores que fazem ótimas promessas e os levam a fazendas onde irão trabalhar sem receber nada. Em 2000, foram libertados 465 trabalhadores nessas condições e neste ano já foram 1812.
O governo fica numa posição ambígua. Por um lado o Ministério do Trabalho promove campanhas contra a escravidão e por outro há cortes de verbas das mesmas. Há ainda muita pressão por parte dos latifundiários e isso faz com que a fiscalização seja menos eficiente.
Rets - O que falta para os trabalhadores rurais serem vistos como cidadãos?
Frigo - Primeiramente é preciso dizer que a pirâmide populacional se inverteu nas últimas décadas. Hoje temos 80% da população vivendo nas cidades, e isso dificulta a visibilidade do movimento. Portanto foi no início da década de 60, quando a relação ainda era inversa, que se conquistou o Estatuto do Trabalhador Rural, que garantiu direitos mínimos aos camponeses. É importante resaltar que nas décadas de 80 e 90 os trabalhadores rurais emergiram como atores políticos, que é a saída para melhorar sua situação, cobrando do governo e da sociedade medidas como a reforma agrária, um resgate histórico da cidadania.
Logo, deve-se acelerar o processo de reforma agrária no país, assim como investir em áreas sociais. Não há motivos para manter a prioridade de recursos em bancos, na economia de exportação e em grandes indústrias. Tem de haver uma política de incentivo à agricultura familiar, que dá trabalho e alimento.
Outro ponto importante é a questão dos direitos humanos. Existe muita violência e impunidade. Só neste ano foram assasinados 25 trabalhadores rurais. Os proprietários de terra têm que parar de se ver como donos não só da terra, mas também da justiça e da vida de outras pessoas.
Rets - Quais são as principais formas de organização de trabalhadores rurais no Brasil? Qual é a sua avaliação delas?
Frigo - O fato de existirem vários movimentos é central para atender à demanda. O lado negativo do movimento fica por conta de sindicatos cartoriais com filosofia assistencialista e que servem como entrave ao reconhecimento de direitos. Afinal, este é um movimento que nasceu no processo da ditadura militar.
O lado positivo é ver os trabalhadores como atores. Até cinco anos atrás, não haveria diferenças entre as partes boas e ruins da organização rural. Hoje esse ator tem visibilidade por meio de movimentos de luta pela reforma agrária como o MST e o próprio movimento sindical. É preciso criar e recriar o espaço de reconhecimento de suas causas, como foi feito com as marchas e visitas a escolas e universidades. Estas, inclusive, recolocaram o tema em suas agendas.
Só que há problemas com a grande mídia, que parece ter um pacto de silêncio para não divulgar ações de movimentos rurais. Quando eles aparecem, é na linha de criminalização.
Rets - Além da mídia, quais são os maiores problemas que essas organizações enfrentam?
Frigo - Um problema é a força da bancada ruralista, que impede o avanço de projetos no Legislativo, como o limite de propriedade rural e a mudança da jurisdição estadual para a federal de casos envolvendo direitos humanos. A representatividade deles na sociedade não é grande, mas no Congresso, sim. O novo Estatuto da Terra está tramitando por iniciativa deles. Se houer mudanças na CLT, os que mais perdem, com certeza, são os trabalhadores do campo, cuja situação será ainda mais precarizada.
Outra dificuldade é conseguir recursos, que atingem uma pequena parcela, quase insignificante. Os pequenos agricultores são maioria, mas apenas alguns têm acesso a esses créditos, por causa da burocracia. Além disso, é um recurso caro, que deveria ser subsidiado. Não há motivos para vermos subsídios como “crime”. Os norte-americanos gastaram US$ 32 bilhões em 2000, enquanto aqui não há nenhum. Lutar na OMC contra esses subsídios não resolve, pois eles são destinados a grandes agricultores, que concorrem entre si. Aqui o modelo tem que ser outro. É mais barato manter uma família no campo do que na cidade. Os recursos estão diminuindo, é preciso ampliá-los.
Rets - Qual é a sua avaliação da Justiça brasileira na questão rural?
Frigo - Grande parcela tem visão patrimonialista e individualista, um olhar acima dos valores da Constituição. O judiciário continua julgando demandas rurais como individuais. A esperança é que alguns juízes tenham visão social, como aconteceu em Santa Maria (RS). Lá o responsável pela ação contra uma ocupação pediu provas da função social da propriedade, e não atestados de posse. A função social não foi provada e o tribunal confirmou a decisão de desapropriar a terra. Isso é uma novidade e mostra como esse olhar só começou a ser acolhido agora. O Ministério Público foi instituído como guardião da sociedade, ele tem que cobrar ações e fiscalizar. Essas são funções novas, o que é um avanço.
As polícias obedecem a oligarquias e parlamentares “leiloam” delegacias. Os inquéritos, assim, já chegam viciados ao Judiciário. Este acaba não fazendo seu papel de ver a sociedade como ela é. Outra deficiência é a existência de tribunais militares, que raramente condenam.
Rets - O senhor participa da Rede Nacional Autônoma de Advogados Populares. Como ela surgiu e funciona?
Frigo - A rede nasceu há seis anos, como uma articulação informal de advogados que prestavam serviços a organizações como a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o Movimento de Atingidos por Barragens. Já havia outras articulações, mas geralmente eram estaduais. Com o crescimento dos movimentos sociais, veio a possibilidade de estender o trabalho a outras regiões, e assim a rede se tornou nacional. A partir das demandas dos movimentos sociais é que realizamos as ações. Os encontros dos movimentos servem como espaço de capacitação e elaboração de estratégias jurídicas. Hoje há cerca de cem advogados trabalhando diretamente com eles e 500 pessoas envolvidas no projeto, que dão sua colaboração sempre que possível.
Rets - Qual tem sido o papel da CPT na organização dos trabalhadores rurais no Brasil?
Frigo - Nós procuramos ser sensíveis aos problemas dos trabalhadores e dar assessoria e apoio a eles para que superem suas dificuldades se organizando. A pressão feita no poder público conta com nosso apoio. A CPT “empresta” sua voz quando necessário, mas quer mesmo que a voz seja deles próprios. Não queremos constituir organizações nossas, mas servir de “sal e fermento” para eles formarem seus organismos. Queremos também que as igrejas se comprometam mais com os direitos dos trabalhadores. Quando fui receber o prêmio, tive uma audiência no BID e mostrei a importância do reconhecimento dos trabalhadores como pessoas com direito de serem assentadas e de se tornarem proprietárias. No Paraná, apoiamos essa bandeira. No governo Lerner, de 97 a 2001, a violação dos diretos humanos se agravou. Foram feitas 500 prisões de trabalhadores rurais, principalmente lideranças. O número é sem precedentes no país e ainda há casos de tortura, 16 assassinatos e despejos.
Rets - Em que medida o prêmio Kennedy ajuda na construção da cidadania dos agricultores e na divulgação dos movimento sociais brasileiros?
Frigo - O prêmio é o reconhecimento da causa dos camponeses, mesmo que tenha sido entregue a uma pessoa. Parece que somos fracos, mas justamente por evidenciarmos nossos problemas é que fomos reconhecidos. O prêmio permite ainda que a sociedade norte-americana nos dê mais atenção. Há pessoas por lá que estão bastante preocupadas com os direitos civis, econômicos e sociais de outras partes do mundo.
Nós temos que apoiar a causa, que depende de políticas públicas para serem solucionadas. Não basta ter proteção, o estado tem que efetivar os direitos garantidos. Nessa medida, o prêmio reforça a luta e garante a permanência da causa e dá a ela maior visibilidade.